segunda-feira, 31 de março de 2008

Herança bendita e maldita

Desde sua fundação em 1696 até hoje, portanto há quase 312 anos, Mariana teve sua criação e desenvolvimento econômico, cultural, artístico e religioso baseado em dois importantes ciclos: primeiro, a fase da mineração aurífera, seguida da mineração ferrífera. A primeira fase durou desde a criação de Mariana até o começo da década de 70. Foi a fase mais gloriosa de Mariana. Na área da educação surgiram os Seminários, o Colégio Providência, Colégio Arquidiocesano e demais estabelecimentos estaduais de ensino primário e secundário. Na área cultural surgiram o Cine Teatro Municipal, o Museu Arquidiocesano, a Casa de Cultura de Mariana, as Bandas de Musica centenárias como a Santa Cecília e União XV de Novembro e outras mais. No plano religioso foi criada a Diocese e posteriormente a Arquidiocese de Mariana. No plano econômico surgiram a Fábrica de Tecidos São José, a Cia. Minas da Passagem, a Mina Del-Rei. O transporte ferroviário de cargas e passageiros era intenso Mas a obra mais importante desse período áureo foi a criação desse belíssimo centro histórico com seus imponentes templos e belíssimo casario colonial barroco, planejado pelo arquiteto português Alpoim, com suas ruas paralelas e transversais formando quarteirões distintos, tudo construído longe das áreas de risco, como as encostas dos morros e margem dos rios. É a fase da mineração aurífera nos legando uma herança bendita.
A partir de 1970, começou a fase da mineração ferrífera. Metade do crescimento populacional urbano nesse período é diretamente decorrente da transferência de funcionários destas mineradoras e seus familiares para o município. A outra parcela do crescimento urbano compõe-se em grande parte de pessoas oriundas de outros municípios, possivelmente atraídas pela demanda de mão-de-obra pouco especializada, por parte das diversas empreiteiras que atuam no município. A nova periferia urbana de Mariana foi sendo constituída tanto através de processo espontâneo de ocupação de solo por populações de baixa renda em regiões desvalorizadas. Os loteamentos implementados pela administração municipal eleitoreira daquela época eram realizados de improviso, sem qualquer planejamento urbano ou saneamento básico, sem inclusão de nenhuma praça, área verde ou algum tipo de equipamento urbano como necessário ao súbito adensamento urbano, como escolas públicas, creches, postos de saúde. A maioria desses loteamentos não era dotada sequer de infra-estrutura urbana básica de água tratada, esgotos sanitários, energia elétrica e calçamento de ruas. Foi aí que começou a fatídica herança maldita.
Felizmente, a partir do ano 2000, com a entrada em vigor do Plano Diretor, muitos melhoramentos já foram feitos nesses bairros da periferia marianense. Hoje os bairros já estão asfaltados, existem escolas, creches, área verde, ginásios poliesportivos, saneamento básico, praças de lazer, postos de saúde. Mas falta muita coisa ainda para acabar definitivamente com a herança maldita. A cidade cresceu quantitativamente e não qualitativamente. Esse crescimento populacional desordenado precisa ser contido com urgência, pois está gerando violência urbana, uma das conseqüências trágicas da herança maldita.

Dom Geraldo Lyrio da Rocha

A tradicionalista comunidade católica marianense viu com muita simpatia e alegria a participação integral do novo Arcebispo de Mariana, Dom Geraldo Lyrio da Rocha, nas cerimônias da Semana Santa.
A exemplo do que fizeram seus antecessores Dom Silvério, Dom Helvécio e Dom Oscar, Dom Geraldo não só presidiu todas as solenidades litúrgicas realizadas na Catedral Basílica, como também participou de todas as procissões litúrgicas como a de Domingos de Ramos e a da Ressurreição e das procissões paralitúrgicas, como a do Depósito e a do Encontro de Senhor dos Passos e a do Senhor Morto na sexta-feira santa. Participou, inclusive, do Ofício de Trevas com suas matinas e laudes.
Os tradicionalistas, como eu e o ilustre escritor marianense Danilo Gomes, com turíbulo e incenso nas mãos, saudamos a boa nova da maior autoridade eclesiástica da Arquidiocese voltar a prestigiar as nossas mais caras tradições religiosas.
Alvíssaras!

segunda-feira, 24 de março de 2008

Selo Comemorativo

A Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, ECT, irá lançar no dia 16 de maio de 2008, sexta-feira, às 20 horas, na Casa de Cultura de Mariana, o selo comemorativo do centenário de nascimento, ocorrido em 16.05.2006, do escritor, jornalista, historiador e professor Waldemar de Moura Santos, um dos fundadores da Academia Marianense de Letras, autor do livro “Lendas Marianenses”, falecido em 30.12.1986.
O cerimonial de lançamento do selo ficará a cargo de funcionários da ECT designados pela Diretoria Regional de Minas Gerais. Na ocasião, os selos comemorativos serão obliterados (carimbados) e entregues aos convidados presentes à solenidade.
Waldemar de Moura Santos foi funcionário da ECT durante quase 40 anos, no cargo de Postalista e chefe de agência em Mariana. Trabalhou também na agência de Ouro Preto.

Estação Ferroviária


A Estação Ferroviária de Mariana é um prédio neocolonial muito bonito, construído em 1914, no início do século XX. A Vale, empresa mineradora sediada na região dos Inconfidentes, numa decisão louvável, restaurou a linha ferroviária entre Mariana e Ouro Preto e trouxe de volta aos trilhos a histórica Maria Fumaça, o trem da Vale. Depois de restaurar a belíssima estação ferroviária, a Vale construiu um parque de diversão para crianças justamente no lugar que impede a visão panorâmica do prédio, que fica escondido. Além de encobrir a bela visão da estação ferroviária, o parque é um monumento ao mau gosto, um trambolho que surgiu no lugar errado. As autoridades municipais deveriam fazer um apelo a Vale para retirar aquele troço horroroso e feio dali. Os marianenses e turistas de bom gosto agradecem!

sábado, 22 de março de 2008

Embargo de Obras Municipais

Eu acredito que a comunidade marianense deve estar escandalizada com o festival de sucessivos embargos de obras municipais feitos pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN). Como não há nenhum esclarecimento a respeito do assunto, a impressão que fica para a opinião pública é a de que os dois órgãos públicos, o Município e o IPHAN, não falam a mesma língua. As obras públicas ou privadas realizadas em Mariana, cidade Monumento Nacional, devem previamente obedecer aos parâmetros do Plano Diretor sob a fiscalização do IPHAN. Por que o projeto de revitalização das praças, já submetido ao exame prévio e aprovação do IPHAN, não deslancha? Afinal de contas quem está descumprindo as normas de execução previamente acordadas? No meu entendimento, pessoas que estiverem descumprindo as normas deveriam ser punidas e obrigadas a ressarcir o erário público devido ao prejuízo causado pelas sucessivas paralisações. O contribuinte marianense precisa saber quem são os responsáveis pelas paralisações contumazes que geram mais despesas. Quem vai pagar os prejuízos? As empreiteiras contratadas para fazer as obras não tomam nenhum prejuízo porque sempre há uma cláusula contratual salvadora que obriga o município a pagar a elas multa pelo eventual atraso das obras. Então, essas sucessivas paralisações de obras municipais interessam a quem? O Ministério Público bem que poderia investigar quem está ganhando com esses embargos. O município, como todo mundo sabe, só está perdendo. Afinal de contas, quem são realmente os órgãos responsáveis pelo atraso das obras? O IPHAN, o Município ou as Empreiteiras?
Perguntar não ofende!

quinta-feira, 20 de março de 2008

Um Cristo Diferente

Waldemar de Moura Santos*
Corria o ano de 1889 e nos falam as crônicas da época que a Semana Santa devia ser completada com as procissões de Depósito e do Encontro, que não se realizavam por falta da imagem do Senhor dos Passos, que fora encomendada e não chegariam a tempo para concretização daquelas públicas cerimônias tão caras aos marianenses.
Surgiu, pois, um grande problema, em parte, de difícil solução. Reuniu-se a Irmandade dos Passos sob a presidência do Comendador Pancrácio Mamão, composta de 188 membros ativos com seus balandraus roxos e de seda caríssima. A Mesa Administrativa, que tinha a responsabilidade de promover e executar o programa da Semana Santa, estudou e discutiu o assunto acaloradamente sem, entretanto, chegar a uma conclusão satisfatória.
- Como há de ser: teremos ou não a Procissão do Encontro? Como a faremos sem a imagem principal? Houve propostas e sugestões sobre a confecção de uma imagem de cera ou de papelão e mesmo de madeira (cabeças e braços), sendo as partes internas em armação coberta de pano, como o é a maioria de nossas imagens vestidas. Numa dessas armações de santos encontramos gravado o ano acima aludido.
Um velho Irmão, depois de muita discussão, conservando-se silencioso, pediu, afinal, a palavra e propôs calma e pausadamente. O caso é muito simples. Vamos escolher um companheiro nosso aqui presente para servir de Senhor dos Passos. Eu o indico na pessoa do senhor Chico Rolão, homem que tem a fisionomia sulcada por sofrimentos, portanto exata de Cristo martirizado. Ele representará bem o papel e penso que não fugirá ao nosso apelo nesta suprema dificuldade, mormente em se tratando de um derradeiro recurso para contornar o problema com vistas à realização da Procissão do Encontro, que vai marcar o maior sucesso religioso nesta cidade.
Muito bem, aplaudiram todos a proposta do melífluo e astuto Irmão Manoel Zagaia. O Provedor, em seguida, com aprovação unânime, designa solenemente o Chico Rolão para servir de Senhor dos Passos. O Irmão escolhido levanta-se, boceja, lança um escarro violento para o lado, com um sorriso mostrando uns velhos dentes numa dentadura falha e imunda, para exclamar.
“Eu aceito comovido a incumbência, mas somente com uma ressalva: nada de cruz e coroa de espinho”.
Mas senhor Rolão, pondera o Provedor faminto dos Anjos, o senhor já viu algum dia Senhor dos Passos sem cruz e sem coroa? A não ser assim, nada feito. Mas pode aceitar que é somente uma representação. A cruz será de sarrafos e coberta de papel escuro e a coroa de espinho é simulada em lata e as extremidades que lhe penetram na cabeça serão ajustadas numa cabeleira de algodão. Nada lhe magoará o físico a não ser a paciência da posição para carregar a cruz e o devido equilíbrio no andor.
- Está bem, nessas condições eu aceito.
Com um voto de louvor ao assentimento do velho Irmão, que assim procedendo, solucionou o problema, poucos dias depois realizou-se a Procissão do Encontro.
Na porta da igreja do Rosário, iniciou-se a cerimônia litúrgica com o sermão do Pretório pregado pelo erudito cônego Calazans. Terminado, movimentou-se o cortejo, descendo a rua em cada Passo até atingir o Largo de São Francisco, onde realizaria o encontro de Jesus com Maria. Aproximando-se o andor da praça, literalmente cheia, a um sinal dado pelo mestre de cerimônias, estaca de súbito a marcha da procissão, enquanto o seminarista do alto do púlpito com o sermão decorado, pateticamente, brada: Parai-vos, desgraçado! O Chico Rolão não se conteve. Acenando para o moço pregador vociferou: esta não! Um frêmito de inquietação invadiu toda a multidão que notou algo sobrenatural, partido do andor e alguém comentou: Senhor dos Passos está falando. A procissão prosseguiu em direção à rua Nova até atingir a Praça da Independência, hoje Gomes Freire, onde a aguardava, além de grande multidão, uma numerosa turma de estudantes de Ouro Preto que ali postara para observar a passagem da procissão. Já em plena praça cercada de magnólias, um dos estudantes gritou;
- Ave César. Cai fora, Chico Rolão. E a turma, em vaia intensa, repetia: Cai fora, cachaceiro, tocador de matraca, palhaço de circo, sacrílego de uma figa. Indignado, Chico Rolão, perdendo a noção do que representava, levanta-se furioso do andor e berra: Bandidos, cretinos, cachorros, polícia para essa corja de imbecis.
Nesse instante, o braço da cruz esbarra num galho de magnólia e toca numa caixa de marimbondos que cai em cima de sua cabeça. Ficou alucinado e deformado pelas picadas dos insetos. Chegando à Sé Catedral, Chico Rolão disse ao Arcipreste: cumpri o meu dever, padeci rudemente, contudo, a procissão não falhou. Ela será para o futuro uma das glórias do povo de Mariana. Mas representei, senhores, um Cristo diferente. E é bom frisar para a história o registrar. Nosso Deus sofreu todos os martírios, menos picada de maribondos e insultos de estudantes!
* (Extraído do livro “Lendas Marianenses”, editado pela Imprensa Oficial em 1966, de autoria do jornalista e escritor Waldemar de Moura Santos, um dos fundadores da primeira Casa de Cultura em Minas Gerais, falecido em 30.12.1986).

Memorial Diogo de Vasconcelos

Na rua Dom Viçoso, outrora rua da Olaria, existia uma casa onde residiu o grande historiador mineiro e marianense Diogo de Vasconcelos. Esse imóvel ruiu e desapareceu. Em 1943, com o desaparecimento do solar dos Vasconcelos, o Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais sugeriu ao Estado de Minas Gerais a desapropriação do imóvel para evitar que ele fosse a leilão público. Em maio de 1943, data do centenário de nascimento de Diogo de Vasconcelos, o Instituto Histórico fez uma romaria cívica a Mariana e ali colocou solenemente com o concurso das Câmaras de Mariana e Ouro Preto, do clero e do povo uma placa comemorativa.
Em 10.05.1946, através do Decreto nº. 2.220, o Estado de Minas Gerais desapropriou o imóvel. Com a doação do imóvel do Estado para o Município de Mariana, será erguido no local pela Prefeitura a Casa do Professor e nela o Memorial de Diogo de Vasconcelos.
A placa que existia afixada no muro já desapareceu há muitos anos. Agora em março de 2008, o muro desabou. No lugar do muro a prefeitura colocou um tapume.

terça-feira, 18 de março de 2008

Cine Teatro Mariana



Comecei a freqüentar o Cine Teatro Mariana em 1950, quando tinha apenas nove anos. Devido à idade, só podia assistir a filmes que eram exibidos nas matinês que se realizavam nas tardes de domingo, às 14 horas. Naquela época, havia sessões cinematográficas, de segunda a sexta-feira, às 19 horas. Aos sábados e domingos, havia duas sessões: a primeira às 18 horas e a segunda às 20 horas. A exemplo do que acontecia nas igrejas, quando os sinos anunciavam as missas três vezes antes delas começarem, igualmente, antes de começar as sessões cinematográficas, uma sirene anunciava o começo delas também por três vezes. As sessões de sábado e domingo, às 18 horas, eram as preferidas dos jovens e namorados que, após assistir aos filmes, iam freqüentar as horas dançantes no Marianense e no Guarany. As sessões das 20 horas eram freqüentadas por casais e pessoas mais idosas. Desde minha infância até a idade adulta, duas empresas exploraram o ramo cinematográfico na cidade: os Irmãos Trópia de Ouro Preto e a Empresa de Cinema Brasil, de Ubá. Depois que essas duas empresas foram embora, Mariana ficou sem diversão cinematográfica durante quase 30 anos. Durante esse tempo, um prefeito resolveu transformar o Cine Teatro Municipal num depósito de material de construção da prefeitura. Ao invés de cinema e teatro, o local virou depósito de cimento, cal, madeira, tijolos, etc. A restauração do prédio só se tornou realidade quando a Casa de Cultura de Mariana, através de seu Presidente, Roque Camêllo, pediu a José Alencar da Silva, então Presidente da FIEMG, hoje, Vice-Presidente da República, que a FIEMG bancasse toda a obra de revitalização do Cine Teatro Municipal. A implantação do Centro de Cultura SESI-Mariana foi viabilizada graças ao estabelecimento de convênio de cooperação mútua com a Prefeitura Municipal de Mariana e o SESI/DRMG. Para tanto o Cine Teatro Mariana foi cedido ao Sistema FIEMG, em regime de comodato, e foram realizadas as reformas e adaptações técnicas necessárias para adequação do espaço à sua nova finalidade. O Centro de Cultura foi inaugurado em 14.10.1993, portanto, há quinze anos. A última novidade: Cine Teatro voltou a se transformar em uma sala de cinema. A primeira sessão cinematográfica aconteceu no dia 6 de março de 2008, quando foi exibido o filme: “O Esplendor de Hollywood”. Para que Mariana voltasse a ter uma sala de cinema, o Sesi fechou uma parceria com a Araújo Cinematográfica.

segunda-feira, 17 de março de 2008

Praça da Sé



Desde sua criação até hoje, a Praça da Sé já sofreu várias modificações em seu formato original. Eu já fui testemunha ocular de três modificações. No final da década de 50, o então prefeito Cônego José Cotta demoliu a praça que tinha um nível mais baixo que a rua e, em frente a igreja da Sé, um chafariz entre duas escadarias de pedra. Retirou o chafariz e as escadas, nivelou o piso da praça, colocou no centro dela um poste com várias luminárias e a calçou com seixos rolados, os famosos pés-de-moleque. Posteriormnte, em 1970, o então prefeito Hélio Petrus Viana calçou a praça com paralepípedos. Agora o prefeito Celso Cota voltou a rebaixar o piso e pretende colocar um novo chafariz no local. A bem da verdade, a atual modificação não é exatamente igual a praça demolida na década de 50, mas tem alguma semelhança com o passado. A atual obra está causando muita polêmica: uns a favor, outros contra. Excluindo a opinião, que eu respeito, das pessoas que são a favor ou contra a modificação com base apenas no seu fanatismo politico, eu acredito que o novo formato da praça abrigará um espaço cultural de multiuso onde poderão ser realizados eventos de pequeno porte como teatro, cinema, concertos, recitais, solenidades cívicas e religiosas, sem interromper o trânsito no centro histórico.

Procissão do Miserere

Há vários anos, o Movimento Renovador de Mariana, organização não governamental sediada na Casa de Cultura de Mariana e presidida por Efigênia Maria da Silva, realiza, à meia noite da sexta-feira da Semana Santa, a já tradicional Procissão do Miserere. Essa procissão foi narrada, pela primeira vez, pelo escritor Waldemar de Moura Santos, um dos fundadores da Academia Marianense de Letras, no seu livro "Lendas Marianenes", editado pela Imprensa Oficial do Estado de Minas Gerais, em 1966. Abaixo, a síntese transcrita do referido livro.
"Durante as sextas-feiras da Quaresma, saía da igreja da Arquiconfraria de São Francisco do Cordão uma procissão em direção à igreja de São Francisco da Ordem Terceira da Penitência.
Era um cortejo formado por Irmãos falecidos e ninguém, vivo, podia assistir a esse macabro desfile, arriscando-se a quem o tentasse à severa repreensão dos componentes. Os moradores da rua Nova ouviam dentro de casa, apavorados, os rumores da procissão lá fora, que era precedida por um grande crucifixo e os braços de São Francisco, cercado em alas de Irmãos que conduziam velas de cera acesas. Os residentes da rua Nova, hoje Dom Silvério, por precaução ou medo, jamais procuraram observar a movimentação do préstito, contentando-se, somente, em ouvir os cânticos tétricos ou a lamentação lúgubre desses fiéis defuntos em peregrinação pelo mundo. Todos conheciam e atestavam a realidade dessas procissões de alma às sextas-feiras da Quarema, mas de perto ou de relance ninguém podia confirmar a existência real delas. Perdurava profundo mistério. Alguns mais ousados tentaram observá-las de longe, outros mais destemidos tentaram impedir a marcha da procissão. Depois de várias tentativas inúteis, a população sossegou, contentando-se em ouvir e jamais espreitar a macabra procissão de almas, cujas alas se engrosssavam à proporção dos anos vencidos.
Um fato, entretanto, aconteceu para arrepiar os cabelos. Uma senhora viúva e respeitável macróbia mudou-se para uma das casas da rua Nova, pois tinha sido despejada de um casebre e repudiada por todos os moradores da rua de São Gonçalo, onde tal mulher era tida como mexeriqueira das mais perigosas. Falava o que sabia e o que ignorava. Era uma faladeira profissional e temível. Nada lhe escapava da língua ferina. Era o diabo em figura de gente. Isolada, passou a espreitar até altas horas da madrugada a vida noturna dos noctívagos inveterados. Certa noite, a velha gazeteira, debruçada sobre a janela, olhava despreocupadamente, a rua ensopada e escuta os ruídos da enxurrada no meio da calçada. Sem que esperasse, surge a procissão do Miserere e um dos Irmãos, envergando um hábito preto e de capuz, ofereceu-lhe uma vela. A terrível mulher recebe a vela e a deposita em cima da cama, voltando à janela para contemplar ao longe o retorno do desfile. À volta, conservando-se no mesmo lugar, o Irmão exige a entrega da vela. A matreira mulher vai pressurosa ao quarto e, ao invés da vela de cera, encontra uma ossada de defunto, constituído de uma canela ainda envolta em terra.
- Mulher, disse o Irmão, guarda sua língua e deixa a noite para os mortos. O sono dos vivos é o prelúdio da morte. Não seja curiosa.
Passados alguns dias, morreu a velha mais faladeira da rua Nova".

Banco do Brasil - 25 anos!

A agência do Banco do Brasil em Mariana comemorou no dia 4 de março de 2008 o seu jubileu de prata. A instalação do Banco do Brasil na cidade no dia 4 de março de 1983 foi uma antiga reivindicação da comunidade marianense formulada no 1º Encontro para o Desenvolvimento de Mariana, o Edem-I. Como funcionário do Banco do Brasil na histórica e vizinha cidade de Ouro Preto (MG), tive a honra de ser escolhido pelo então gerente daquela agência para tomar as primeiras providências relativas à sua instalação em Mariana. Fui eu que escolhi e fiz a locação do imóvel onde seria instalada a nova agência, na avenida Salvador Furtado. A atual localização da agência é na mesma avenida, porém, em outro prédio. Fizemos a aquisiçaõ de linhas telefônicas e faxes, contratamos empresas de segurança e limpeza. O primeiro gerente da agência do Banco do Brasil em Mariana foi o marianense Miguel Jorge Marques da Silva, filho do grande maestro da União XV de Novembro, Jorge Marques da Silva. A atual gerente do Banco do Brasil em Mariana é Rosângela Salvador dos Santos. É a primeira mulher gerente na agência durante esses 25 anos de existência. Para comemorar este jubileu de prata da agência, a gerente Rosângela fez uma campanha filantrópica entre a clientela do Banco angariando fundos para compra de cobertores a serem doados a entidades beneficentes da cidade. Parodiando o slogan do proprio Banco que diz que o Banco é todo teu, eu diria que que o banco é de todos nós. Parabéns aos funcionários do BB e a toda comunidade marianense que no histórico Edem-I de 1979 reivindicou e conseguiu a instalação da agência do Banco do Brasil em Mariana.

Semana Santa com Incenso

Danilo Gomes*
Não me levem a mal, não, mas ainda bem terminou a folia: Rollings Stones, U-2/Bono Vox e Carnaval. Como podem ver, sou careta e antigado. Gosto do cantochão, música sacra antiga e Semana Santa. Já nasci antigo, em Mariana, a cidade mais antiga de Minas e sua primeira capital. Nasci ouvindo sinos de velhas igrejas. Ainda menino de colo, aspirei o bom cheiro do incenso litúrgico das venerandas cerimônias sacras.
Vocês já viram que me amarro numa missa cantada; sempre que posso vou à missa no Mosteiro de São Bento, aqui e no Rio. Meu espírito é ligado à Semana Santa. Desculpem meu saudosismo, meus prezados leitores (tenho, pelo menos, meia dúzia), mas não posso deixar de registrar uma observação. É o seguinte: no meu tempo, a Semana Santa era celebrada com respeito, unção, silêncio e pesar. As bandas de música tocavam marchas fúnebres. As matracas nos lembravam o martírio, a agonia e a morte de Jesus Cristo. Oficio de Trevas, Procissão do Encontro, Descendimento da Cruz, Procissão do Enterro. Depois, a alegria do Sábado da Aleluia e do Domingo da Ressurreição, do Advento do Espírito Santo e Seus dons inefáveis, Sua luz esplendorosa. Festivos, os sinos jubilosos anunciavam o triunfo sobre a paixão e a morte. Tradições que nos vieram da Igreja primitiva, dos apóstolos, das catacumbas, dos martírios em Roma e em todo o Império.
Nós, os antigos, os caretas, tentamos segurar os velhos estandartes, preservar as opas das vetustas confrarias, celebrar as consagradas liturgias. Amamos o olor do incenso percorrendo as naves das igrejas. Sim, senhores, nossa irmandade é muito antiga. Nós, da Velha Guarda, amamos o silêncio e o respeito, em especial na Semana Santa. Bom livro para a temporada: “As Exigências do Silêncio”, de Anselm Grün, tradução de Carlos Almeida Pereira, Editora Vozes, já em 3ª edição.
Para rematar a crônica caretona de hoje, permitam-me anotar um pensamento de Johann Eckhart: “Em todo o universo, nada existe de mais parecido com Deus que o silêncio”.
Dr. Ferrari, acho que estou ficando velho. É grave, doutor?
(Transcrito do jornal “Hoje em Dia”, de 19.03.2006).