terça-feira, 28 de novembro de 2017

Feira Multissetorial


Feira Multissetorial fomenta geração de negócios em Mariana (MG)
Fundação Renova participa de evento empresarial com a organização de palestras e painéis sobre empreendedorismo, tecnologia e inovação
 
A promoção do empreendedorismo, o estímulo ao uso de novas tecnologias e a possibilidade de geração de novos negócios estão no foco da 12ª edição da Feira Multissetorial de Mariana – MultiSet 2017. O evento será realizado entre 30 novembro e 2 de dezembro, na Arena Mariana. A feira reúne micro e pequenas empresas dos setores industrial, comercial e de serviços, que tenham interesse em apresentar seus produtos e diferenciais para companhias de maior porte, em um ambiente propício para o desenvolvimento de negócios. A entrada é franca.
Organizada pela Associação Comercial, Industrial e Agropecuária de Mariana (ACIAM) / Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL-Mariana), a Feira MultiSet 2017 visa desenvolver o empreendedorismo local. A estrutura do evento é composta pelos stands de expositores, espaço para rodada de negócios, palestras técnicas e motivacionais, cursos e treinamentos e atrações culturais, com programação diversificada.
Neste ano, a Fundação Renova é parceira da Feira MultiSet e apresentará ao público palestras e painéis que estimulam a economia local e fomentam ações de inovação e tecnologia. Com o tema “Empreenda Mariana”, a Feira MultiSet 2017 contará com workshops, apresentações de cases de empreendedores locais e presença de palestrantes, entre eles o ídolo do vôlei, Tande. O ex-jogador vai mostrar – de maneira descontraída e prática –, como funciona a rotina dentro de quadra comparada à empresarial, e como driblar os obstáculos para ter sucesso, com a palestra “A vida é um jogo”. Especialista em varejo e pioneiro no e-commerce, o premiado consultor Fred Rocha é outro dos palestrantes. Dono de uma larga experiência no mercado e expert em “pensar fora da caixa”, ele vai abordar o tema “Nunca Pare de Empreender”.
A programação foi idealizada para que empresários e empreendedores tenham contato facilitado com entidades de referência e representatividade setorial, conheçam seus trabalhos e identifiquem formas de dispor da sua parceria para o fortalecimento do ambiente de negócios local. Passarão pelo palco técnicos, diretores, superintendentes e presidentes de entidades como Sebrae, Fiemg, Federaminas, FCDL, OCEMG, UFOP, Fundação Dom Cabral, dentre outras, além de consultorias de negócio e cases de sucesso local.
Além da participação na feira, a Renova vai promover o Lab Truck Senai. É uma carreta que se transforma em laboratório aberto: um ambiente de conhecimento sobre novas tecnologias e inovação. O objetivo é que estudantes e empreendedores possam experimentar o espaço e pensar em novas possibilidades de negócios e/ou atuação no mercado de trabalho. A programação é gratuita e o Lub Truck funcionará no estacionamento da Arena Mariana, a partir de 30 de novembro, de 9h às 14h.
Segundo Paulo Rocha, líder do programa de Tecnologia e Inovação da Fundação Renova, a Feira MultiSet 2017 é importante por ser uma das principais fomentadoras de negócios em Mariana e região. “As micro e pequenas empresas têm papel-chave no desenvolvimento regional e, certamente, espaços para trocas de experiência, compartilhamento de conhecimento e oportunidades de negócios, que são fundamentais para que elas cumpram esse papel”, destaca Paulo Rocha.
O evento proporcionará ao empresariado oportunidade de geração de novos negócios e investimentos em diversos setores. A feira ainda conta com patrocínio do Governo de Minas por meio da Cemig, e apoio da Vale e da Prefeitura de Mariana. A previsão é de que cerca de 40 micro e pequenos empresários, expositores de produtos e serviços, participem do evento. A organização espera alcançar um público aproximado de 6.000 visitantes durante os três dias de feira, com geração de cerca de R$ 1 milhão em negócios entre as empresas expositoras.
O presidente da ACIAM/CDL Mariana, Geraldo Carvalho, ressalta a importância da Feira Multissetorial para o fomento da economia de Mariana. “Essa é a contribuição da ACIAM para reaquecer o comércio local, criando novas oportunidades e promovendo os negócios entre os empresários. As nossas expectativas são as melhores com a feira, que é o reconhecimento do potencial da nossa cidade para sediar eventos como este”, reforça.
Fonte: Rede/Douglas Comunicação

domingo, 26 de novembro de 2017

Balões de ensaio*


O Congresso e o Supremo discutem o foro privilegiado, mas já há quem defenda abrir uma exceção antes mesmo de estabelecer a própria regra. Se colar, o novo foro incluiria os ex-presidentes da República, o que beneficiaria Lula, Michel Temer... Colou ...além de Dilma Rousseff , José Sarney e Fernando Collor.

Marcela Matos e Laryssa Borges
     Desde que a Lava-Jato avançou sobre a classe política, um jargão ganhou os corredores do poder: “Sem foro, é Moro”. O trocadilho explica por que o presidente Michel Temer deu status de ministro a Moreira Franco, acusado de cobrar propina da Odebrecht, por que Dilma Rousseff, quando ainda governava, tentou fazer de Lula, multi-investigado no petrolão, seu ministro-chefe da Casa Civil. O peemedebista e a petista tentaram blindar seus aliados contra as investigações, livrando-os da pena do juiz Sergio Moro, responsável pelos processos da Lava-Jato na primeira instância. Dilma fracassou, mas Temer conseguiu. Resultado: Moreira continua a despachar no Planalto, enquanto Lula foi sentenciado por Moro a nove anos e seis meses de prisão. Não se trata de um caso isolado. O juiz já condenou 113 réus na maior investigação da história do país. Por sua vez, o Supremo Tribunal Federal (STF), a quem cabe julgar os políticos enredados no escândalo, não condenou ninguém. Gozar da prerrogativa de foro representa, até agora, andar de mãos dadas com a impunidade.
Diante disso, causa perplexidade – aparente, como se verá – que os parlamentares, eles mesmos, estejam querendo restringir o foro privilegiado, pois na quarta feira 22, a Comissão de Constituição e Justiça da (CCJ) da Câmara aprovou um projeto que mantém a prerrogativa apenas para os presidentes dos três poderes, além do vice-presidente da República .Pelo texto, que ainda precisa tramitar por uma comissão especial antes de ser votado no plenário da Casa, não só os congressistas mas ministros de tribunais superiores perdem o direito de ser julgados em instâncias especiais. “Não dá para ter dois pesos e duas medidas. Se o grande argumento para o fim do foro é ter igualdade perante a lei, que seja assim para todos”, diz Efraim Filho (DEM-PB, relator da proposta na Câmara.
O truque é o seguinte. Sob a aparência de uma boa iniciativa, os parlamentares querem incluir os magistrados e procuradores no balaio dos que perdem o foro com o objetivo de constrangê-los e, assim, levá-los a deixar tudo como está. A CCJ também aprovou a restrição com a intenção de embolar um julgamento retomado na quinta-feira 23 pelo Supremo Tribunal Federal. Até o fechamento desta edição, seis ministros do STF votaram por limitar o foro dos parlamentares em casos de crimes relacionados ao próprio mandato. O julgamento foi interrompido por um pedido de vista do ministro Dias Toffoli.
Ao simularem estar tratando do assunto, os deputados pretendiam dissuadir o STF de discutir o tema. É tão claro que a intenção dos políticos não é limitar o foro que, antes mesmo de ter sido definida uma nova regra, já se começou a discutir uma exceção. O balão de ensaio destina-se a tentar ampliar o rol de contemplados, estendendo a prerrogativa aos ex-presidentes da República, beneficiando Temer, Dilma, Lula, FHC, Collor e Sarney. O mote inicial é evitar que Michel Temer, ao deixar o poder, caia nas mãos de um juiz de primeira instância e acabe na cadeia, enrolado nas malas e nas fitas da JBS. A medida, é claro, também beneficiaria Lula, cujo caso deixaria as mãos de Moro e subiria para o Supremo. “Ex-presidentes têm de ser julgados em tribunal mais qualificado em função da relevância do cargo”, alega o deputado Vicente Cândido (PT-SP), acrescentando que, como condenar ex-presidente “dá ibope”, o juiz de primeira instância pode cair na tentação. Se a restrição do foro se tornar inevitável, os parlamentares pretendem, ao menos, aprovar uma regra de transição, para garantir que os processos em curso, como os da Lava-Jato, continuem no Supremo. Ninguém quer acertar contas com Moro. Todos preferem a lassidão até aqui demonstrada pela mais alta corte do país.
O foro, que beneficia cerca de 55000 pessoas, virou uma distorção. Diz o ministro Luis Roberto Barroso, do STF: “Criamos um direito penal que produziu um país de ricos delinquentes. No Brasil, as pessoas são honestas se quiserem, porque, se não quiserem, não acontece nada”.
*Fonte: revista Veja – edição 2558, de 29.11.2017.

Nas mãos do Supremo


Na sequência abaixo é um desalento para um país que clama por estabilidade jurídica e pelo fim da impunidade de seus cidadãos mais poderosos.

• No dia 11 de outubro, o plenário do Supremo Tribunal Federal, por 6 votos a 5, decidiu que cabia ao Senado a palavra final sobre as medidas cautelares aplicadas contra o senador Aécio Neves, flagrado achacando em 2 milhões de reais um empresário bilionário.
• No dia 17 de outubro, com base na decisão do STF, o Senado, por 44 votos contra 26, derrubou as medidas cautelares, entre as quais constava o recolhimento noturno do senador, e devolveu-lhe o mandato parlamentar.
• No dia 24 de outubro, depois de assistir ao que transcorrera em Brasília, a Assembleia Legislativa em Cuiabá, por unanimidade, soltou o deputado Gilmar Fabris, preso havia quarenta dias depois de ser filmado fugindo da polícia. De pijama, com uma maleta na mão.
• No mesmo dia, igualmente inspirada no que se passara em Brasília, a Assembleia Legislativa do Rio Grande do Norte, por 19 votos a 1, revogou decisão do Tribunal de Justiça e devolveu o mandato ao deputado Ricardo Motta, acusado num caso de desvio de 19 milhões de reais.
• No dia 17 de novembro, chegou a vez da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, que, por 39 votos contra 19, além de uma abstenção e onze ausências, libertou o presidente da Casa, Jorge Picciani, mais dois colegas, Paulo Melo e Edson Albertassi, todos presos sob acusação de corrupção.
• No dia 21, cinco juízes do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, por unanimidade, voltaram a mandar prender o trio de deputados estaduais do Rio de Janeiro. Eles retornaram à prisão no mesmo dia e estão recolhidos na cadeia pública de Benfica, na Zona Norte da cidade.
A balburdia, como ilustra a cronologia acima, começou quando o STF se curvou às pressões do Senado e reinterpretou as leis de modo a aliviar as punições contra o senador Aécio Neves. A senha do alivio percorreu os parlamentos do país como um rastilho de impunidade. Alega-se que assembleias legislativas e câmaras de vereadores estão fazendo uma leitura abusiva da decisão do STF, mas o episódio deixa uma lição inequívoca: O Supremo enredou-se nas malhas do foro privilegiado, reeditou seu entendimento anterior das leis para beneficiar um senador outrora respeitado – e o país agora paga o preço da instabilidade.
Está nas mãos do Supremo retomar o bom caminho.
*Fonte: Carta ao leitor – Veja – edição 2558, de 29.11.2017.

Assim não dá*
Giuliano Guandalini
 
Estudo do Banco Mundial expõe o custo elevado dos servidores públicos brasileiros – e como os seus privilégios agravam a desigualdade de renda no país
Todos são iguais perante a lei. Assim se lê na abertura do artigo 5° da Constituição da República do Brasil, promulgada em 1968. Mas essa mesma Constituição criou uma classe específica de brasileiros: os servidores públicos. Ao contrário da avassaladora maioria dos brasileiros, eles ganharam o direito de se aposentar recebendo o valor integral de quando estavam na ativa - e isso sem falar nas gratificações. O privilegio foi concedido como maneira de ampliar o apoio à nova Constituição, que à época enfrentou a oposição feroz do PT e de diversos sindicatos, e também como instrumento para atrair profissionais qualificados para o governo.Com o passar dos anos, o custo dessa prerrogativa extrapolou os limites do razoável. Há 1 milhão de servidores federais aposentados e eles custam aos cofres públicos 77 bilhões de reais ao ano (ou 77 000 por beneficiado). No regime privado, há 29 milhões de aposentados que custam 150 bilhões de reais (pouco mais de 5 000 por beneficiado). Ou seja, proporcionalmente, um buraco muito menor).
Esse é apenas um dos desequilíbrios analisados no estudo do Banco Mundial intitulado “Um ajuste justo: análise da eficiência e equidade do dogasto público no Brasil”, divulgado na semana passada. A parir de comparações internacionais, fica evidente como o governo brasileiro gasto muito- e mal. Pior, em vez de cumprirem o papel de favorecer os pobres e dirimir injustiças, os gastos públicos favorecem pessoas de rendimento elevado e contribuem para o aumento da desigualdade. A aposentadoria média dos trabalhadores da iniciativa privada é de 1240 reais e o teto é de 5.531,31 reais. No mundo da fartura do setor público, o valor máximo equivale ao salário dos ministros do Supremo Tribunal Federal, de 33.763, mas existe muita gente que fatura acima do limite.
A desproporcionalidade não aparece apenas nas aposentadorias. Os servidores federais da ativa ganham, em média, 67% mais do que os empregados em cargos semelhantes no setor privado. É a maior diferença encontrada entre os mais de cinquenta países analisados.
Com 160 páginas, o estudo foi encomendado por Joaquim Levy, então ministro da Fazenda, em 2015. Os autores sugerem uma série de reformas e corte de subsídios que poderiam resultar em uma economia equivalente a 8% do PIB (mais de 500 bilhões de reais). A divulgação do trabalho veio a calhar para Michel Temer, que tenta emplacar a reforma da Previdência com o argumento de que é necessário extinguir privilégios. Será um ganho para o país se, nesta batalha, Temer for bem sucedido.
*Fonte: revista Veja – edição 2558, de 29.11.2017.

quarta-feira, 22 de novembro de 2017

Ao restabelecer prisões TRF-2 dá aula ao STF

   
Josias de Souza é jornalista e colunista da Folha de São Paulo

Em decisão unânime —5 votos a 0 —, o Tribunal Regional Federal da 2ª Região restabeleceu a ordem de prisão contra três caciques do PMDB do Rio de Janeiro: Jorge Picciani, Paulo Melo e Edson Albertassi. Com essa decisão, os desembargadores do TRF-2 deram uma lição ao Supremo Tribunal Federal. Ensinaram o seguinte: quando a Justiça não faz da roubalheira uma oportunidade para impor a lei, os tribunais viram uma oportunidade que os larápios aproveitam.
Presos na semana passada, os três xamãs do PMDB fluminense foram libertados por decisão da Assembleia Legislativa do Rio. Abriram-se as celas sem que ao menos o TRF-2 fosse comunicado sobre a revogação de sua decisão. Nesta terça-feira, ao discorrer sobre a encrenca, um dos desembargadores do tribunal, Paulo Espírito Santo, disse ter enxergado as imagens dos deputados deixando o presídio de carro, sem ordem judicial, como “um resgate de filme de faroeste”.
O doutor resumiu assim a cena: “Acabo de ver, na sexta-feira passada, algo que nunca imaginei ver na vida. Nunca vi uma coisa dessas. Não há democracia sem Poder Judiciário. Quando vi aquele episódio, que a Casa Legislativa deliberou de forma absolutamente ilegítima, e soltou as pessoas que tinham sido presas por uma Corte federal, pensei: o que o povo do Brasil vai pensar disso? Pra quê juiz? Pra quê Ministério Público? Pra quê advogado? Se isso continuar a ocorrer, ninguém mais acreditará no Judiciário. O que aconteceu foi estarrecedor. Que país é esse?”
O desembargador Espírito Santo não disse, talvez por cautela, mas o Brasil virou um país em que a Suprema Corte às vezes fica de cócoras quando o Poder Legislativo faz cara feia. Assim procedeu ao lavar as mãos no caso do tucano Aécio Neves, autorizando o Senado a anular sanções cautelares como a suspensão do mandato e o recolhimento domiciliar noturno. Conforme já noticiado aqui, o STF tinha a exata noção de que abria um precedente que não passaria em branco nos Estados.
O debate sobre as prerrogativas dos legislativos para revogar prisões e sanções impostas a parlamentares federais e estaduais ainda vai dar muito pano para a manga. No Rio, a maioria cúmplice da Assembleia não há de ficar inerte. Farejando o cheiro de queimado, outro desembargador, Abel Gomes, mencionou inclusive a hipótese de o TRF-2 requerer ao STF intervenção federal na Assembleia fluminense.
A confusão certamente chegará ao Supremo, oferecendo aos ministros a oportunidade de se reposicionar em cena. Sob pena de desmoralização do Judiciário. Na antessala das urnas de 2018, não restará ao brasileiro senão a alternativa de praguejar na cabine de votação: ''Livrai-me da Justiça, que dos corruptos me livro eu”.


Após parir Aécio, STF terá de embalar Picciani     
Josias de Souza
Apenas um brasileiro em um milhão é capaz de entender a confusão jurídica que o Supremo Tribunal Federal provocou ao lavar as mãos no caso de Aécio Neves. Mas basta entrar em qualquer boteco de Copacabana que a encrenca está lá. A coisa ferveu depois que a Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro tentou sumir com o sabonete no caso que envolve o deputado estadual Jorge Picciani e Cia..
A procuradora-geral Raquel Dodge levou ao Supremo a queda de braço travada entre o Legislativo fluminense e a Justiça. Sustentou que a votação da Assembleia que anulou a prisão e a suspensão do mandato de três caciques do PMDB — já devolvidos à cela pelo TRF-2— ofende as leis e a Constituição. A doutora pede que a decisão da Assembleia do Rio seja anulada, esclarecendo-se que o veredicto do Supremo que favoreceu Aécio não vale para parlamentares estaduais.
Por 6 votos a 5, os ministros do Supremo autorizaram o Senado a devolver a Aécio o mandato e anular sanções impostas ao senador tucano por uma turma da própria Suprema Corte. Um ano antes, os ministros tinham decidido o contrário num processo envolvendo Eduardo Cunha. Afastaram-no da presidência da Câmara e do exercício do mandato. Por causa disso, Cunha foi cassado, preso e condenado por Sérgio Moro. Não saiu mais da cadeia.
Os ministros que estenderam a mão para Aécio sustentam que o Supremo não foi contraditório ao ignorar que tratara Cunha a pontapés. Faz sentido. Não é que a Corte máxima do Judiciário brasileiro seja incoerente, apenas possui jurisprudência múltipla. O frequentador de boteco também não é contra o roubo. O que ele não suporta é a ideia de continuar sendo roubado por aqueles que foram eleitos para representá-lo.
Embora não ignorassem que o refresco servido a Aécio seria replicado nos Estados, os ministros do Supremo reclamam do mau uso do precedente. Ainda não se deram conta do papelão em que se meteram. Magistrado que se queixa da aplicação da jurisprudência que ajudou a criar é como um comandante de navio que reclama do mar.
O Supremo terá de operar uma mágica retórica para atender aos pedidos da procuradora-geral Raquel Dodge. São conhecidas as histórias de gente tirando gênios da garrafa. Mas ainda não se ouviu nada a respeito de gente obrigando o gênio a fazer o caminho de volta.
Quem pariu Aécio que embale Picciani. Não será simples. É como se o cozinheiro de um botequim prometesse desfritar um ovo na frente dos frequentadores do estabelecimento. Como ninguém conseguiu realizar semelhante façanha, os magistrados logo perceberão que a respeitabilidade do Judiciário é como a virgindade. Perdeu está perdida. Não dá segunda safra.

segunda-feira, 20 de novembro de 2017

Liberação de parlamentares presos será questionada no STF


Associação de juízes considera inconstitucional expedição de um alvará de soltura pelo legislativo
“Doutrina Aécio” foi base para Alerj tirar Picciani e mais dois deputados da cadeia
Após a Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) decidir tirar da cadeia o presidente da Casa, Jorge Picciani, o deputado Paulo Melo e o líder do governo, Edson Albertassi, a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) informou ontem que vai questionar no Supremo Tribunal Federal (STF) decisões dos Legislativos estaduais que liberaram parlamentares da prisão.

“A decisão é inconstitucional porque não tem previsão para isso. Entendemos como inconstitucional e ilegal a expedição de um alvará de soltura sem passar pela juiz. Eles estão expedindo alvará e as secretarias de Segurança estão cumprindo. Isso compete ao Poder Judiciário”, disse o presidente da AMB, Jayme Oliveira.
O magistrado afirma que, mesmo nos casos em que a Constituição estadual dá poder a Assembleia Legislativa para rever prisão de deputados, essa norma vai contra a Constituição Federal. A constituição do Rio confere essa prerrogativa à Alerj. “Não se aplica, nem que a Constituição do Estado diga isso”, afirmou.
Oliveira disse que deputados estaduais estão derrubando decisões do Judiciário com base no julgamento do STF no caso do senador Aécio Neves (PSDB-MG). A jurisprudência está sendo chamada de “doutrina Aécio”. Por maioria, o plenário da Corte decidiu que medidas cautelares diversas da prisão preventiva – já prevista na Constituição – que interferem no cumprimento do mandato também precisam passar pelo crivo do Congresso após determinadas pelo Poder Judiciário. A AMB vai entrar com uma ação para que o STF limite a decisão do caso Aécio apenas para membros o Congresso.
“A finalidade da norma é proteger o mandado, mas isso não vai ao ponto de proteger aqueles que estão cometendo crimes numa situação excepcional que o Brasil vivencia. Estamos vendo uma série de crimes envolvendo grupos de parlamentares, não faz sentido impedir de parlamentares serem processados”, disse Oliveira.
Por 39 votos a 19, e uma abstenção, em apenas 20 minutos, a Alerj decidiu soltar Picciani, Melo e Albertassi. A decisão garantiu aos três a permanência do mandato, desfazendo a decisão da segunda instancia do Judiciário no Rio. Pelo menos dois deputados estaduais do país que estavam afastados do cargo pela Justiça, um de Mato Grosso e outro no Rio Grande do Norte, já foram beneficiados. No caso mato-grossense, a Assembleia revogou a prisão preventiva do deputado estadual, Gilmar Fabris (PSD). No Rio Grande do Norte, a Assembleia Legislativa derrubou o afastamento do deputado Ricardo Mota (PSB).
Comentário: como se lê acima, a Associação de Magistrados Brasileiros já anunciou que vai recorrer ao STF para tentar derrubar a proteção aos deputados estaduais. Será divertido acompanhar o julgamento pela TV Justiça. Conforme já comentado aqui, o Supremo virou ex-Supremo ao evoluir do rigor contra Eduardo Cunha para a suavidade com Aécio Neves. Segundo o colunista Josias de Souza, os ministros terão de fazer mágica para construir uma terceira jurisprudência para diferenciar os corruptos estaduais. Tirar coelhos da cartola talvez não seja o bastante. Será preciso tirar cartolas de dentro do coelho...

sexta-feira, 17 de novembro de 2017

Casas legislativas viraram tribunais de exceção

Josias de Souza é jornalista e colunista

Ao livrar da cadeia três parlamentares soterrados por evidências de corrupção, a Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro consolida um fenômeno ruinoso. Está entendido que o Congresso Nacional e os legislativos estaduais tornaram-se tribunais de exceção.
Elaborada nas pegadas da queda da ditadura militar, a Constituição de 88 cercou os parlamentares de imunidades que protegiam o exercício do mandato. Os autores do texto constitucional não poderiam supor que o antídoto da imunidade viraria no futuro o veneno da impunidade. O Supremo Tribunal Federal poderia colocar ordem na gafieira. Mas preferiu atravessar o samba ao omitir-se no caso de Aécio Neves. Uma maioria de cúmplices e de compadres devolveu ao senador tucano o mandato e a liberdade noturna que a 1ª Turma da Suprema Corte havia cerceado.
Estabeleceu-se a partir de Brasília uma atmosfera de vale-tudo que anula o movimento benfazejo inaugurado pela Lava Jato. Tinha-se a impressão de que o Brasil ingressara numa nova fase - uma etapa em que todos estariam submetidos às leis. Devagarzinho, o país foi retomando a rotina de desfaçatez. Brasileiros com mandato continuam se comportando como se não devessem nada a ninguém, muito menos explicações.
Congelaram-se as investigações contra Michel Temer. Enfiaram-se no freezer também as denúncias contra os ministros palacianos Moreira Franco e Eliseu Padilha. Enquanto Curitiba e Rio de Janeiro produzem condenações em escala industrial, a Suprema Corte não sentenciou um mísero réu da Lava Jato. Em vez disso, preferiu servir refresco a Aécio Neves, instalando nas Assembleias Legislativas um clima de liberou geral que resulta em absurdos como o que se verifica no Rio.
Transformados em tribunais de exceção, os legislativos conspurcam a democracia. Neles, políticos desonestos livram-se de imputações criminais não pelo peso dos seus argumentos, mas pela força do corporativismo. Simultaneamente, a sociedade é condenada ao convívio perpétuo com a desonestidade impune. Fica-se com a impressão de que a turma do estancamento da sangria está muito perto de prevalecer.

Bretas: STF pode criar ‘pessoas imunes’ às leis
Marcelo Bretas, juiz da Lava Jato no Rio de Janeiro, fez uma avaliação ácida da decisão do Supremo Tribunal Federal que transferiu para o Poder Legislativo a palavra final sobre punições cautelares impostas a parlamentares. A despeito de toda a cautela que seu ofício impõe, o magistrado declarou: “Não posso comentar decisões do STF. Mas faço uma análise política do dia a dia das investigações criminais. A impressão que tenho é que essa situação, aliada ao foro privilegiado, poderia criar categorias de pessoas imunes ao Direito Penal”.
As declarações de Bretas foram feitas em entrevista publicada na edição desta sexta-feira (17) de O Globo. A conversa ocorreu antes da deflagração da operação Cadeia Velha, que resultou na prisão de três cardeais do PMDB fluminense: os deputados Jorge Picciani, presidente da Assembleia Legislativa do Rio, Edson Albertassi e Paulo Melo. Sem saber, o juiz soou premonitório, pois o Legislativo estadual ameaça anular a ordem de prisão e a suspensão do mandato dos três parlamentares. Solicitadas pela Procuradoria, as providências foram deferidas pelo Tribunal Regional Federal da 2ª Região nesta quinta-feira (16).
Para atenuar os constrangimentos, Picciani, Albertassi e Melo entregaram-se à Polícia Federal pouco depois do veredicto do TRF-2. Passaram a noite no xadrez em que está preso o ex-governador Sérgio Cabral, da mesma facção partidária. Mas não devem permanecer por muito tempo atrás das grades. Conforme já noticiado aqui, os colegas de legislativo começaram a tramar a anulação das sanções impostas aos três antes mesmo do término da sessão do TRF-2. Embalada pelo exemplo do Senado, que anulou sanções impostas a Aécio Neves (PSDB-MG), a Assembleia do Rio equipou-se rapidamente para tentar deliberar sobre a matéria ainda nesta sexta.
Ficou surpreso com o tamanho do esquema de corrupção no Rio?, perguntou-se a Bretas. E ele: “Posso falar sobre o processo da Operação Calicute, que já foi julgado. O que me assustou, naquele caso, foi a extensão e a capilaridade. Parece que tem mais gente envolvida. É uma metástase. A cada hora surgia um personagem novo”.
Bretas considerou “um absurdo” a hipótese de aprovar no Congresso uma nova lei restringindo as delações. Projeto de lei em tramitação na Câmara proíbe, por exemplo, réus presos de negociarem acordos de colaboração judicial. “Restringir a delação é um absurdo”, disse o juiz. “Para quem está colaborando, é um direito de defesa. Não se pode restringir esse direito a pretexto de proteger investigados”.
Para o juiz, há uma reação política à Lava Jato. “Tem e sempre terá”, declarou, antes de fazer uma distinção entre dois tipos de encrencados: “O empresário que se corrompe, que tem uma unidade produtiva, sabe que pode se reerguer. Mas o político corrupto não tem vida própria, é um parasita. Se tirar o poder dele, vai morrer de fome. Grande parte dos colaboradores, normalmente, são empresários. Quem está lutando contra, normalmente, é agente público envolvido com corrupção”
Instado a comentar os diversos habeas corpus concedidos pelo ministro Gilmar Mendes, do Supremo, para rever decisões suas, Bretas soou como se quisesse realçar sua consciência tranquila: “Sou proibido de fazer comentários sobre decisões de tribunais superiores. Mais importante do que receber decisão contrária de instância superior, é ter a tranquilidade de que se trata de uma decisão puramente técnica e imparcial”.
Bretas comentou também a tese do ministro Luís Roberto Barroso, desafeto de Gilmar no Supremo, segundo a qual está em curso uma ‘operação abafa’ da Lava Jato. “Confio na percepção dele e concordo plenamente. Exemplos disso são as leis aprovadas na madrugada. Desconfio que, na véspera dos feriados de fim de ano, haja tentativa de aprovar mais leis que dificultem as investigações”.
Sobre a possibilidade de o Supremo rever a regra que abriu a porta da cadeia para corruptos condenados em segunda instância, Bretas afirmou: ''Respeito qualquer decisão, porque o Supremo é digno de todo o meu respeito e obediência. A prisão após condenação em segunda instância foi um golpe muito grande na corrupção. Quando o tribunal confirma a sentença condenatória, os recursos disponíveis à defesa já não têm efeito suspensivo, então a decisão tem que ser aplicada…”

Pedidos de bloqueio realçam a fortuna de Lula
O maior problema político de Lula não é o fato de ele ter ficado parecido com os políticos que atacava. Seu principal drama é a evidência de que Lula ficou muito diferente do que diz ser. Num instante em que Lula percorre o país como defensor dos pobres, a Procuradoria pede, em Brasília, o sequestro de seus bens e de seu filho Luís Cláudio no montante de R$ 24 milhões. A defesa de Lula contestou o pedido. Sustentou não haver provas contra ele na Operação Zelotes. Mas não disse nenhuma palavra sobre o valor requerido pelo Ministério Público Federal.
Lula atravessou ileso o escândalo do mensalão. Sobreviveu à ruína produzida por sua criatura Dilma Rousseff. Alvo de diversos inquéritos e ações penais, mantém a pose de perseguido. Condenado a 9 anos e meio de cadeia, conserva-se no topo das pesquisas. Mas deve tornar-se inelegível. E já perdeu aquela aura de político imbatível. Seu prestígio diminuiu na proporção direta do aumento do seu patrimônio.
Este não foi o primeiro pedido de bloqueio de bens. Sérgio Moro mandara sequestrar R$ 10 milhões em julho. Quando o Banco Central achou R$ 600 mil numa conta corrente de Lula, o PT disse em nota que seu líder supremo morreria de fome. No dia seguinte, descobriram-se mais de R$ 9 milhões em planos de previdência privada. Lula dizia ser um palestrante de sucesso. Mas delatores da Odebrecht informaram que as palestras eram mero truque para bancar com dinheiro sujo os confortos de um benfeitor. A fortuna de Lula não combina com os valores morais que ele acha que representa.

terça-feira, 14 de novembro de 2017

Supremo pode avacalhar a Operação Lava Jato


Josias de Souza é jornalista e colunista da Folha de São Paulo

     Vêm aí mais duas boas oportunidades para o brasileiro conferir de que lado está o Supremo Tribunal Federal. A presidente Cármen Lúcia marcou para quinta-feira da semana que vem o julgamento que pode limitar a abrangência do foro privilegiado. Depois, em sessão a ser agendada, a Suprema Corte decidirá se mantém ou não a regra que abriu as portas das cadeias para os condenados na segunda instância. Uma combinação malandra de veredictos pode inaugurar uma pizzaria que servirá impunidade a larápios graúdos e avacalhará a Lava Jato.
 
     Suponha que a maioria dos ministros do Supremo vote a favor da restrição do foro, nos termos propostos pelo relator Luís Roberto Barroso: permanecem no Supremo apenas os processos relativos a crimes cometidos por congressistas e ministros durante e em razão do exercício do mandato ou do cargo público. Nessa hipótese, desceriam do Éden Supremo do Judiciário para o mármore quente da primeira instância todos os processos relacionados à Lava Jato. A arquibancada soltaria fogos.
 
     Agora imagine que, em julgamento posterior, a mesma Suprema Corte decida rever a jurisprudência que autorizou a prisão após a confirmação das sentenças por um tribunal de segunda instância. Neste caso, as sentenças de juízes como Sergio Moro lançarão fachos de luz sobre as propinas e outras delinquências. Mas depois que o país enxergar a roubalheira, as luzes serão apagadas e os condenados recorrerão em liberdade à segunda, à terceira e até à quarta instância do Judiciário. Os processos se arrastarão por mais de dez anos. E muitos serão assados no forno da prescrição.
 
     O procurador da República Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, parecia sentir um cheiro de queimado quando falou sobre o tema numa entrevista ao blog, no mês passado. Ele lamentou a inexistência de punição de criminosos graúdos pilhados na maior investigação anticorrupção da história:
“Faltam os grandes chefes desse esquema criminoso, as pessoas mais responsáveis entre todas por ele, que foram os políticos poderosos que organizaram. Falta a responsabilização deles. E a responsabilização deles tramita exatamente no Supremo Tribunal Federal”.
 
     No fundo, o Supremo Tribunal Federal julgará a si mesmo. Condenou-se à execração quando abriu o caminho, por 6 votos a 5, para o Senado anular as sanções cautelares impostas ao senador tucano Aécio Neves. A plateia tem agora mais um par de oportunidades para verificar se o Supremo utiliza sua supremacia para fazê-la de idiota.


Aos poucos, escracho vira outro nome de normal     
Josias de Souza
 
     O Brasil vive uma espantosa época. Nela, o absurdo adquiriu uma doce e admirável naturalidade. É como se a anormalidade fosse o normal. Dois episódios ocorridos no final de semana desafiam a paciência do brasileiro. Num, o multicondenado José Dirceu foi filmado numa festa sacudindo o corpo e a tornozeleira eletrônica. Noutro, o magistrado Gilmar Mendes encontrou-se com o denunciado Michel Temer.
 
     No mês passado, Gilmar foi acusado pelo colega Luís Roberto Barroso, em plena sessão do Supremo Tribunal Federal, de ser parceiro da “leniência em relação à criminalidade do colarinho branco”. Não parece preocupado. Dirceu coleciona duas condenações na Lava Jato. Deveria estar preso. Mas também não exibe sinais de preocupação.
Juntas, as penas de Dirceu no petrolão somam 41 anos de cana. Ele estava atrás das grades. Mas a Segunda Turma do Supremo, com o voto favorável de Gilmar, autorizou-o a aguardar o julgamento de recursos em liberdade. Por isso ele dança.
 
     Além de Temer, participou da reunião com Gilmar o ministro Eliseu Padilha. Denunciados por corrupção, Temer e Padilha deveriam ser investigados. Mas a Câmara congelou os processos. E Gilmar acha natural encontrá-los. Algo de absolutamente anormal precisa acontecer em Brasília. Do contrário, o escracho será o outro nome de normal.

domingo, 5 de novembro de 2017

Os príncipes da República


Mailson da Nóbrega
Juízes têm vantagens incompatíveis com a realidade do país

      O Tema é espinhoso, mas deve ser tratado. Existe uma casta de servidores públicos com salários e benefícios difíceis de justificar. Veja-se o caso das aposentadorias. A dos servidores do Judiciário federal é de 24959 reais, em média; a do Legislativo, 28551 reais; a de quem aposenta pelo INSS, 2202 reais.
     O Judiciário brasileiro é um dos mais caros do mundo. No estudo “O custo da Justiça no Brasil: uma análise comparativa exploratória”, Luciano Da Ros mostrou que o Judiciário custava 1,3% do PIB em 2014, mais do que o PIB de oito estados do Norte e Nordeste. Seu orçamento é o mais alto entre as federações ocidentais. A despesa por habitante é superior à de Judiciário da Suécia, Holanda, Itália, Portugal, Inglaterra e Espanha. Quase tudo devido a salários.
A participação dos gastos do Judiciário federal no Orçamento mais que dobrou entre 1988 e 2016, de 1,2% para 2,5%. Enquanto as despesas reais cresceram 3,14 vezes no período, as do Judiciário subiram 6,5 vezes. Parte delas adveio do aumento de demandas judiciais, mas o maior efeito resultou de salários.
     A explicação está na autonomia administrativa e financeira concedida pela Constituição (artigo 99), que permite ao Judiciário enviar seu orçamento diretamente ao Congresso e propor os próprios salários. O Congresso costuma aprovar e o Executivo nunca veta. O mesmo ocorre no Ministério Público e na defensoria Pública.
     Onde revoluções forjaram a democracia moderna – Inglaterra (1688), Estados Unidos (1776) e França (1789) – o envio do orçamento cabe exclusivamente ao Executivo. Na França, o orçamento do Judiciário é executado por um ministério. Aqui a ideia era evitar que o Judiciário fosse manietado financeiramente pelo Executivo, o que jamais fez sentido.
      A Constituição indexou salários de magistrados aos de ministros do Supremo Tribunal Federal (artigo 93, inciso V). Há estados em que mais de 90% dos juízes ganham acima do salário dos Ministros do STF, que é o teto. Isso porque penduricalhos não considerados no teto aumentam os rendimentos. Assim, no Acre juízes ganham mais de 80 000 reais por mês. Outro dia, um juiz de Mato Grosso recebeu atrasados de mais de 500 000 reais. Tudo isso tem aprovação do Conselho Nacional de Justiça, ressalve-se.
     O desembargador Fábio Orieto tomou posse no Tribunal Regional Eleitoral da 3ª Região com um discurso corajoso. Disse que é preciso “superar o modelo corporativo-sindical da Justiça no Brasil”. Para ele, a reforma do Judiciário (2004) não superou os males do patrimonialismo, do clientelismo, do assembleísmo corporativo e da burocratização. Até os reforçou.
     Os salários de juízes devem levar em conta as responsabilidades e as restrições para o exercício de suas nobres funções. Há, todavia, que rever excessos dessa e de outras carreiras, incluindo salários iniciais que superam os de funções semelhantes no setor privado, ideia não aplicável a casos como os de magistrados.

sexta-feira, 3 de novembro de 2017

Me engana que eu gosto


Eliane Cantanhêde

     Políticos vivem de mistificações e muitos deles, ao mesmo tempo em que se colocam como vítimas por serem negros, mulheres, (ex) pobres ou de recantos longínquos do país, usam essas mesmas condições para se fazerem populares e abocanharem privilégios. Ninguém desconhece que o Brasil tem ranços racistas e machistas e que a principal origem de nossas piores mazelas está na desigualdade social, mas usar essa triste realidade para detratar os adversários, de um lado, e obter simpatias e boquinhas , do outro, é ilegítimo e cínico.
     A ministra dos Direitos Humanos, Luislinda Valois (PSDB), é desembargadora aposentada, mulher das leis, mas, quando a lei afeta seus interesses, aí são outros quinhentos. Como mostrou a Coluna do Estadão, ela tentou furar o teto salarial do funcionalismo, de R$ 33,7 mil, e acumular R$ R$ 61,4 mil com aposentadoria e salário de ministra, alegando que a adequação à lei, “sem sombra de dúvidas, se assemelha ao trabalho escravo”. Logo, quis tirar vantagem com a conexão entre sua condição de negra e a escravidão, quando o teto vale (ou deveria valer) para brancos, negros, mulatos, asiáticos...
     Curiosamente, não há registro de nenhuma manifestação de Valois contra a portaria do trabalho escravo que mobilizou o país. Se alguém no governo botou a boca no trombone, foi a secretária nacional de Cidadania, Flavia Piovesan – aliás, exonerada na quarta-feira pela Casa Civil. Alegação: ela já estava a caminho mesmo de Washington, para representar o Brasil na Comissão de Direitos Humanos da OEA. Ah, bom!
     O caso Luislinda Valois remete a um outro personagem que, há décadas, usa a seu favor a imagem de pobre, migrante nordestino, operário e...”de esquerda”. . Sim, Luiz Inácio Lula da Silva, o inimputável, o que pode tudo, ganhar presentes de empreiteiras, fatiar a propina da Petrobras, ratear estatais e fundos de pensão entre os “companheiro”, jogar as culpas na mulher já falecida, lavar as mãos diante dos erros da pupila feita presidente da República.
     Se Valois quis driblar a lei por ser negra e argumentar contra a escravidão (dela, não dos outros), Lula sempre se pôs acima das críticas, de regras e agora da lei porque tem a biografia que tem. E como cuida bem dessa biografia! Em nome dela e da mítica do nordestino pobre e “perseguido pelas elites”, ele preferiu aceitar sítio, triplex na praia e apartamento em frente ao seu de presente, em vez de simplesmente comprá-los. Seu dinheiro legal dava e sobrava para isso. Mas perder a aura de pobrezinho? Jamais. Esse é o seu “trunfo”.
     A mitificação vale também para o presidenciável Jair Bolsonaro, que se faz passar por “militar” até hoje, angariando apoios e simpatias nas bases das Forças Armadas e de saudosistas da ditaduras, apesar de estar na reserva do Exercito, desde 1988, como capitão, estar na política desde 1990, há quase 30 anos., e desfrutar do seu sétimo mandato como deputado federal.
     Para se consolidar no segundo lugar das pesquisas e escamotear sua falta de condições para disputar a Presidência, o que ficou chocantemente evidente em suas últimas entrevistas, Bolsonaro se esconde por trás da fantasia de “militar”, da mesma forma como Lula usa a de “pobre e do povo”, e Valois, a de “negra vítima da escravidão”.
     São todas mistificações para dourar a realidade ou “enganar um bobo, na casca do ovo”. Não um, mas milhões de bobos que não conseguem ver que Lula, o campeão das pesquisas, é réu seis vezes, já condenado uma vez, e deixou de ser pobre há décadas. E que Bolsonaro, o segundo colocado foi um militar expelido prematuramente da tropa e é um político medíocre, que só sai do anonimato raramente e à custa de bandeiras do atraso. Só não vê quem não quer.