A cidade de Mariana foi tombada pelo Decreto-Lei federal nº 25, de 30.11.1937, e foi considerada Monumento Nacional através do Decreto-Lei federal nº 7.713, de 06.07.1945. Como se sabe, o tombamento é o registro pormenorizado de um bem, com a finalidade de protegê-lo, preservá-lo e, assim, mantê-lo sob a custódia do Poder Público. O bem tombado fica sob o abrigo e a tutela pública. O tombamento é uma forma de intervenção do Estado na propriedade privada. Foi instituído no Brasil através do decreto-lei federal nº 25, de 30.11.1937, como instrumento de preservação do patrimônio histórico e cultural e é a primeira norma jurídica de limitação administrativa ao direito à propriedade.
A Constituição de 1988 estabeleceu que é da alçada da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios a responsabilidade pela proteção dos documentos, obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural, bem como de monumentos, paisagens notáveis e sítios arqueológicos. O artigo 5º, inciso LXXIII assim determina: “qualquer cidadão é parte legitima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas jurídicas e do ônus da sucumbência”. A Constituição, ao estender esta responsabilidade ao cidadão, democratiza este processo, associando a preservação do patrimônio histórico e cultural ao exercício da cidadania.
Apesar de toda essa proteção legal e constitucional, tanto antes como depois do tombamento de Mariana, vários danos foram causados ao nosso patrimônio através de destruição de monumentos civis ou religiosos. Podemos citar vários casos como, por exemplo, a demolição do prédio do antigo Grupo Escolar Gomes Freire, ao lado da Câmara Municipal de Mariana, na Praça Minas Gerais. A demolição do belíssimo Palácio Azul do Bispo de Câmaco, onde residiu Dom Silvério Gomes Pimenta, na Rua das Mercês. Desapareceu também a residência de José Joaquim da Rocha, figura marcante no episodio do “Fico”, de Dom Pedro, e de Diogo de Vasconcelos na Rua Dom Viçoso. Também várias capelas foram destruídas, como a do São Gonçalo, do Morro de Santana, do Menino Jesus ao lado da igreja do Carmo, do Senhor dos Passos ao lado da igreja da Sé.
Nestes últimos 50 anos, como testemunha ocular e contemporânea dos fatos, devo dizer que os maiores responsáveis pela descaracterização de Mariana, em passado remoto ou recente, seja por ação ou omissão, foram a administração pública municipal e o IPHAN. Apesar de ter sido tombada em 1937 e tornada monumento nacional em 1945, somente na década de 1960 que Mariana passou a ter um escritório local do IPHAN. Por não ter, na época, plano diretor nem lei orgânica que surgiu apenas em 1990, legislação esta que os então prefeitos, para não entrar em atrito político com seus correligionários, não a respeitavam e a ignoravam, o município, por ação ou omissão, aprovava qualquer projeto de construção, restauração ou demolição de prédios históricos ou não, com a conivência ativa ou passiva do IPHAN.
Na Rua Barão de Camargo, por exemplo, um proprietário construiu um imóvel invadindo a rua, usando indevidamente o espaço público. A obra foi embargada há mais de 20 anos, mas o prédio continua ali inacabado, no mesmo lugar. Nenhuma autoridade consegue tirar aquela excrescência dali. Em 1968, o IPHAN, então dirigido pelo engenheiro e arquiteto Dr. Wilson, com a promessa não cumprida de restaurá-lo, mandou derrubar um imóvel colonial de mais de 200 anos de fundação e que existia na Rua Dom Viçoso. O saudoso funcionário José Tomé dos Anjos, na época mestre-de-obras do IPHAN e que era contra a demolição, me doou a foto em que aparecem os pedreiros e carpinteiros do órgão federal derrubando o referido imóvel histórico. Na ocasião, meu pai, que era jornalista, historiador e um dos herdeiros do imóvel, denunciou a absurda demolição no jornal “O Globo” o que causou muita repercussão nos meios culturais do país. Na década de 1980, o município, por ação, construiu o ginásio poliesportivo e o IPHAN, por omissão, só tentou embargar a obra quando ele estava quase pronto.
Muitos proprietários de imóveis no centro histórico de Mariana construíram garagem em seus imóveis alterando a fachada deles e causando desnivelamento dos passeios, com ou sem autorização expressa do município ou do IPHAN. Naquela época, se não me engano, não havia e creio que ainda não há lei que impeça a abertura de garagens. É muito conhecido o principio jurídico de que o que não é proibido é permitido. Ao contrario do que muita gente pensa, uma nova lei obrigando a todos fechar suas garagens seria ilegal, pois a retroatividade dela prejudicando direito adquirido de pessoas é inconstitucional. Mas, sinceramente, reconheço que a abertura de garagens alterou muito o visual da fachada original dos imóveis.
Para evitar ilações apressadas e juízos equivocados a respeito de minha coerência pessoal devo esclarecer que, em 1980, com aprovação do projeto pelo município e pelo IPHAN, eu também construí uma casa em estilo colonial com garagem no centro histórico no lugar do antigo imóvel colonial acima citado anteriormente e demolido pelo IPHAN em 1968, não alterando, portanto, nenhuma fachada de prédio anterior ainda existente.
Antigamente, por não ter plano diretor, plano de uso e ocupação de solo, nem lei orgânica do município, a aprovação ou desaprovação de plantas e projetos no município era muito subjetiva. Dependia muito do humor e da boa ou má vontade dos arquitetos de plantão tanto na prefeitura quanto no IPHAN. Não havia parâmetros técnicos balizadores para aprovar ou desaprovar projetos: o que valia para uns já não valia para outros. Não havia isonomia nem coerência nas decisões. Era por causa dessa falta de critérios que muita gente ficava revoltada quando projetos idênticos de uns eram aprovados e de outros rejeitados.
No meu entendimento, porém, não devemos lamentar o que já foi destruído no passado, mas sim, não descaracterizar mais e preservar com muito carinho o pouco que ainda existe: o pequeno, mas belo e maravilhoso centro histórico de Mariana!
A Constituição de 1988 estabeleceu que é da alçada da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios a responsabilidade pela proteção dos documentos, obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural, bem como de monumentos, paisagens notáveis e sítios arqueológicos. O artigo 5º, inciso LXXIII assim determina: “qualquer cidadão é parte legitima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas jurídicas e do ônus da sucumbência”. A Constituição, ao estender esta responsabilidade ao cidadão, democratiza este processo, associando a preservação do patrimônio histórico e cultural ao exercício da cidadania.
Apesar de toda essa proteção legal e constitucional, tanto antes como depois do tombamento de Mariana, vários danos foram causados ao nosso patrimônio através de destruição de monumentos civis ou religiosos. Podemos citar vários casos como, por exemplo, a demolição do prédio do antigo Grupo Escolar Gomes Freire, ao lado da Câmara Municipal de Mariana, na Praça Minas Gerais. A demolição do belíssimo Palácio Azul do Bispo de Câmaco, onde residiu Dom Silvério Gomes Pimenta, na Rua das Mercês. Desapareceu também a residência de José Joaquim da Rocha, figura marcante no episodio do “Fico”, de Dom Pedro, e de Diogo de Vasconcelos na Rua Dom Viçoso. Também várias capelas foram destruídas, como a do São Gonçalo, do Morro de Santana, do Menino Jesus ao lado da igreja do Carmo, do Senhor dos Passos ao lado da igreja da Sé.
Nestes últimos 50 anos, como testemunha ocular e contemporânea dos fatos, devo dizer que os maiores responsáveis pela descaracterização de Mariana, em passado remoto ou recente, seja por ação ou omissão, foram a administração pública municipal e o IPHAN. Apesar de ter sido tombada em 1937 e tornada monumento nacional em 1945, somente na década de 1960 que Mariana passou a ter um escritório local do IPHAN. Por não ter, na época, plano diretor nem lei orgânica que surgiu apenas em 1990, legislação esta que os então prefeitos, para não entrar em atrito político com seus correligionários, não a respeitavam e a ignoravam, o município, por ação ou omissão, aprovava qualquer projeto de construção, restauração ou demolição de prédios históricos ou não, com a conivência ativa ou passiva do IPHAN.
Na Rua Barão de Camargo, por exemplo, um proprietário construiu um imóvel invadindo a rua, usando indevidamente o espaço público. A obra foi embargada há mais de 20 anos, mas o prédio continua ali inacabado, no mesmo lugar. Nenhuma autoridade consegue tirar aquela excrescência dali. Em 1968, o IPHAN, então dirigido pelo engenheiro e arquiteto Dr. Wilson, com a promessa não cumprida de restaurá-lo, mandou derrubar um imóvel colonial de mais de 200 anos de fundação e que existia na Rua Dom Viçoso. O saudoso funcionário José Tomé dos Anjos, na época mestre-de-obras do IPHAN e que era contra a demolição, me doou a foto em que aparecem os pedreiros e carpinteiros do órgão federal derrubando o referido imóvel histórico. Na ocasião, meu pai, que era jornalista, historiador e um dos herdeiros do imóvel, denunciou a absurda demolição no jornal “O Globo” o que causou muita repercussão nos meios culturais do país. Na década de 1980, o município, por ação, construiu o ginásio poliesportivo e o IPHAN, por omissão, só tentou embargar a obra quando ele estava quase pronto.
Muitos proprietários de imóveis no centro histórico de Mariana construíram garagem em seus imóveis alterando a fachada deles e causando desnivelamento dos passeios, com ou sem autorização expressa do município ou do IPHAN. Naquela época, se não me engano, não havia e creio que ainda não há lei que impeça a abertura de garagens. É muito conhecido o principio jurídico de que o que não é proibido é permitido. Ao contrario do que muita gente pensa, uma nova lei obrigando a todos fechar suas garagens seria ilegal, pois a retroatividade dela prejudicando direito adquirido de pessoas é inconstitucional. Mas, sinceramente, reconheço que a abertura de garagens alterou muito o visual da fachada original dos imóveis.
Para evitar ilações apressadas e juízos equivocados a respeito de minha coerência pessoal devo esclarecer que, em 1980, com aprovação do projeto pelo município e pelo IPHAN, eu também construí uma casa em estilo colonial com garagem no centro histórico no lugar do antigo imóvel colonial acima citado anteriormente e demolido pelo IPHAN em 1968, não alterando, portanto, nenhuma fachada de prédio anterior ainda existente.
Antigamente, por não ter plano diretor, plano de uso e ocupação de solo, nem lei orgânica do município, a aprovação ou desaprovação de plantas e projetos no município era muito subjetiva. Dependia muito do humor e da boa ou má vontade dos arquitetos de plantão tanto na prefeitura quanto no IPHAN. Não havia parâmetros técnicos balizadores para aprovar ou desaprovar projetos: o que valia para uns já não valia para outros. Não havia isonomia nem coerência nas decisões. Era por causa dessa falta de critérios que muita gente ficava revoltada quando projetos idênticos de uns eram aprovados e de outros rejeitados.
No meu entendimento, porém, não devemos lamentar o que já foi destruído no passado, mas sim, não descaracterizar mais e preservar com muito carinho o pouco que ainda existe: o pequeno, mas belo e maravilhoso centro histórico de Mariana!
Nenhum comentário:
Postar um comentário