A Justiça tem uma dívida histórica com a cidade de Mariana. Sempre que nossos interesses foram levados às barras do Tribunal, por uma quizila ou outra, sacrificou-se a cidade em detrimento de uma entrelinha, uma morosidade cúmplice, uma interpretação singular, ou o simples silêncio mortal das catacumbas.
Comecemos por este último, o silêncio mortal das catacumbas que se abateu sobre nossas autoridades após a vergonhosa fraude eleitoral que se tem notícia nestas plagas. Em 1982, após um prodigioso governo levado a efeito pelo saudoso Jadir Macedo, Mariana tinha diante de si uma estrada pavimentada para o desenvolvimento, com seus cofres recheados pelas divisas do minério e um programa de crescimento advindo de um fórum de debates chamado EDEM-I (Encontro para o Desenvolvimento de Mariana).
O sonhado título de Patrimônio da Humanidade parecia uma realidade próxima, já que a cidade vizinha Ouro Preto conquistara seu reconhecimento em 1980 e o cenário urbano favorecia a conquista.
As urnas eleitorais, no entanto, conspiravam contra este sonho. Das sepulturas afloraram votos vultosos, em fichas de votação que depois de alguns dias perderam-se na fumaça do tempo ou no fogo (criminoso ou acidental) que vitimou o cartório eleitoral. Conta-se que uma figura conhecida na cidade foi vista nas proximidades do fórum naquela noite, envolvida nas sombras, cumprindo papel semelhante àquele do professor denunciante das eleições de 2008.
Tempos outros aqueles, tempos sinistros, de ofegante ditadura. Com todos estes ingredientes, um silêncio tumular se abateu sobre as investigações. O futuro de Mariana se perdeu nas cinzas e na fumaça daquele incêndio no cartório... inexplicável!
Menos de três anos depois a justiça nos virou as costas. Vesga e trêmula a pena do então Juiz Sacha Calmon Navarro Coelho condenou Mariana a ter nas proximidades do Centro Histórico um paquidérmico Ginásio inútil e faraônico. O eminente Juiz diz ter cumprido a lei, a letra fria da lei e por isso se penitenciou, pediu perdão ao povo de Mariana e esperava ter sua decisão revista por um Tribunal Superior. Que pena!
Por mais bem intencionado que fosse o Magistrado, os tribunais superiores até hoje não revisaram aquela malsinada decisão e o povo de Mariana jamais o perdoará por sua cômoda omissão. E, se meditasse, de fato, na igreja de São Francisco, como disse que o faria antes da decisão, as luzes da Fé teriam lhe dito o que se aprende nos primeiros anos de academia. O Direito, nobre juiz, não se faz apenas da Lei. Julgar só com lei é despir a Justiça de sua imparcialidade subjetiva, é tirar do ato de julgar a mágica fundamental da hermenêutica, é ferir de morte os anseios sociais que escrevem as leis e postam-se por detrás da norma. O julgamento só pela lei é um julgar sem alma, é trair aquilo que Rousseau definiu como a “vontade geral” e que Montesquieu imortalizou como sendo “o espírito das leis”, a soberania do povo em nome de quem se legisla.. Com isso, a interpretação singular do grande jurista, ainda que presa à lei, afastou Mariana um pouco mais do sonhado título de Patrimônio da Humanidade – deu-nos um ginásio, um elefante branco!
De erros e acertos se fez a história. A mesma mão que tolhe, por vezes é a mesma que afaga. Atrasada por décadas no desenvolvimento do ensino, de repente Mariana deu um largo passo. Em meados da década de 90 investiu o que tinha, e que não tinha, para financiar a implantação de um curso de Direito no ICHS. Prestígio político, influência do Clero, professores, amigos, ilustres, dinheiro público... todos envolvidos em um único ideal: dar a Mariana e a seus filhos (poucos), a oportunidade de frequentar um curso superior de primeira linha. Filigranas jurídicas e uma morosidade cúmplice levaram de Mariana o seu triunfo dois anos depois. E o curso de Direito que aqui se implantara, da noite para o dia se foi para Ouro Preto... Vão-se os dedos e os anéis também! Foi assim, na calada de uma noite qualquer, que o vimos pelas costas, sufocado em um emaranhado de decisões (ou a falta delas), a se arrastar pelos labirintos do Judiciário há mais de 12 anos... Justiça tardia não é justiça, dizia-nos um sábio professor. Mariana ainda não se curou dessa ferida, a espada da justiça que deveria defendê-la a feriu. ..
Por último, e não menos importante, a Justiça agora ameaça impor um novo tropeço à Primaz das Minas. Paira a espada de Dâmocles sobre nossas cabeças. A espada que deveria defender-nos de novo nos ameaça! O cenário nefasto se faz com personagens trôpegas: um professor aloprado disse ter sido cooptado e ferido em sua paixão pelo que não sabe o que é, na calada da noite denuncia, mente, tumultua. Parece que se trama de novo uma nova inconfidência que se faz “atrás de portas fechadas, à luz de velas acesas...” E a justiça, aquela que deveria ser cega, encontra nas entrelinhas de um emaranhado de leis conflitantes um motivo qualquer para, de novo, tentar desviar Mariana do caminho do crescimento. É como um sacudir de ombros, se todos estão errados, eu não! Foi assim, o decidir naquela noite de 31 de março. O juiz teve 50% de chances de errar, pois a lei eleitoral, o código eleitoral e a lei das inelegibilidades e as decisões anteriormente tomadas assim o facultava.., mas, alto lá senhor Magistrado, a espada tremula é sobre nossas cabeças, nossas vidas aqui construídas. Nossos votos, legítimos e democráticos, soberanos, não foram levados em conta em nenhuma das decisões... Que seria se optasse pelos outros 50%?
Sou um operador do Direito e por sê-lo sou quase que obrigado a acreditar na justiça, justiça dos homens que desejaríamos imitasse a justiça de Deus, a mergulhar no mais profundo das paixões humanas e conhecer-lhes as verdadeiras razoes. Oxalá a Sabedoria lhe tire a venda dos olhos neste momento em que precisamos mais que justiça, precisamos de lucidez. E que nenhum outro Magistrado me venha, a posteriori, com o lero-lero de se desculpar ao povo desta terra, depois de denegar-lhe a justiça. Desculpas, como já vimos, não nos repõem as oportunidades perdidas. E foi-se o tempo em que a história nos julgava, perdoando nossos erros pelo lento passar dos anos.
O feito de hoje nos julga com imparcialidade o dia seguinte, com uma velocidade nunca antes vista, dispensando os pareceres encomendados, bem elaborados e plenos de fundamentos jurídicos. Isso nos dá tempo de sentir o efeito danoso das nossas decisões erradas. Que a Justiça nos seja pródiga, pelo menos por uma vez! E que possamos nos ecos de Virgilio e escrever na bandeira de Mariana: Jus quae será tamen!
*Professor e Advogado
Comecemos por este último, o silêncio mortal das catacumbas que se abateu sobre nossas autoridades após a vergonhosa fraude eleitoral que se tem notícia nestas plagas. Em 1982, após um prodigioso governo levado a efeito pelo saudoso Jadir Macedo, Mariana tinha diante de si uma estrada pavimentada para o desenvolvimento, com seus cofres recheados pelas divisas do minério e um programa de crescimento advindo de um fórum de debates chamado EDEM-I (Encontro para o Desenvolvimento de Mariana).
O sonhado título de Patrimônio da Humanidade parecia uma realidade próxima, já que a cidade vizinha Ouro Preto conquistara seu reconhecimento em 1980 e o cenário urbano favorecia a conquista.
As urnas eleitorais, no entanto, conspiravam contra este sonho. Das sepulturas afloraram votos vultosos, em fichas de votação que depois de alguns dias perderam-se na fumaça do tempo ou no fogo (criminoso ou acidental) que vitimou o cartório eleitoral. Conta-se que uma figura conhecida na cidade foi vista nas proximidades do fórum naquela noite, envolvida nas sombras, cumprindo papel semelhante àquele do professor denunciante das eleições de 2008.
Tempos outros aqueles, tempos sinistros, de ofegante ditadura. Com todos estes ingredientes, um silêncio tumular se abateu sobre as investigações. O futuro de Mariana se perdeu nas cinzas e na fumaça daquele incêndio no cartório... inexplicável!
Menos de três anos depois a justiça nos virou as costas. Vesga e trêmula a pena do então Juiz Sacha Calmon Navarro Coelho condenou Mariana a ter nas proximidades do Centro Histórico um paquidérmico Ginásio inútil e faraônico. O eminente Juiz diz ter cumprido a lei, a letra fria da lei e por isso se penitenciou, pediu perdão ao povo de Mariana e esperava ter sua decisão revista por um Tribunal Superior. Que pena!
Por mais bem intencionado que fosse o Magistrado, os tribunais superiores até hoje não revisaram aquela malsinada decisão e o povo de Mariana jamais o perdoará por sua cômoda omissão. E, se meditasse, de fato, na igreja de São Francisco, como disse que o faria antes da decisão, as luzes da Fé teriam lhe dito o que se aprende nos primeiros anos de academia. O Direito, nobre juiz, não se faz apenas da Lei. Julgar só com lei é despir a Justiça de sua imparcialidade subjetiva, é tirar do ato de julgar a mágica fundamental da hermenêutica, é ferir de morte os anseios sociais que escrevem as leis e postam-se por detrás da norma. O julgamento só pela lei é um julgar sem alma, é trair aquilo que Rousseau definiu como a “vontade geral” e que Montesquieu imortalizou como sendo “o espírito das leis”, a soberania do povo em nome de quem se legisla.. Com isso, a interpretação singular do grande jurista, ainda que presa à lei, afastou Mariana um pouco mais do sonhado título de Patrimônio da Humanidade – deu-nos um ginásio, um elefante branco!
De erros e acertos se fez a história. A mesma mão que tolhe, por vezes é a mesma que afaga. Atrasada por décadas no desenvolvimento do ensino, de repente Mariana deu um largo passo. Em meados da década de 90 investiu o que tinha, e que não tinha, para financiar a implantação de um curso de Direito no ICHS. Prestígio político, influência do Clero, professores, amigos, ilustres, dinheiro público... todos envolvidos em um único ideal: dar a Mariana e a seus filhos (poucos), a oportunidade de frequentar um curso superior de primeira linha. Filigranas jurídicas e uma morosidade cúmplice levaram de Mariana o seu triunfo dois anos depois. E o curso de Direito que aqui se implantara, da noite para o dia se foi para Ouro Preto... Vão-se os dedos e os anéis também! Foi assim, na calada de uma noite qualquer, que o vimos pelas costas, sufocado em um emaranhado de decisões (ou a falta delas), a se arrastar pelos labirintos do Judiciário há mais de 12 anos... Justiça tardia não é justiça, dizia-nos um sábio professor. Mariana ainda não se curou dessa ferida, a espada da justiça que deveria defendê-la a feriu. ..
Por último, e não menos importante, a Justiça agora ameaça impor um novo tropeço à Primaz das Minas. Paira a espada de Dâmocles sobre nossas cabeças. A espada que deveria defender-nos de novo nos ameaça! O cenário nefasto se faz com personagens trôpegas: um professor aloprado disse ter sido cooptado e ferido em sua paixão pelo que não sabe o que é, na calada da noite denuncia, mente, tumultua. Parece que se trama de novo uma nova inconfidência que se faz “atrás de portas fechadas, à luz de velas acesas...” E a justiça, aquela que deveria ser cega, encontra nas entrelinhas de um emaranhado de leis conflitantes um motivo qualquer para, de novo, tentar desviar Mariana do caminho do crescimento. É como um sacudir de ombros, se todos estão errados, eu não! Foi assim, o decidir naquela noite de 31 de março. O juiz teve 50% de chances de errar, pois a lei eleitoral, o código eleitoral e a lei das inelegibilidades e as decisões anteriormente tomadas assim o facultava.., mas, alto lá senhor Magistrado, a espada tremula é sobre nossas cabeças, nossas vidas aqui construídas. Nossos votos, legítimos e democráticos, soberanos, não foram levados em conta em nenhuma das decisões... Que seria se optasse pelos outros 50%?
Sou um operador do Direito e por sê-lo sou quase que obrigado a acreditar na justiça, justiça dos homens que desejaríamos imitasse a justiça de Deus, a mergulhar no mais profundo das paixões humanas e conhecer-lhes as verdadeiras razoes. Oxalá a Sabedoria lhe tire a venda dos olhos neste momento em que precisamos mais que justiça, precisamos de lucidez. E que nenhum outro Magistrado me venha, a posteriori, com o lero-lero de se desculpar ao povo desta terra, depois de denegar-lhe a justiça. Desculpas, como já vimos, não nos repõem as oportunidades perdidas. E foi-se o tempo em que a história nos julgava, perdoando nossos erros pelo lento passar dos anos.
O feito de hoje nos julga com imparcialidade o dia seguinte, com uma velocidade nunca antes vista, dispensando os pareceres encomendados, bem elaborados e plenos de fundamentos jurídicos. Isso nos dá tempo de sentir o efeito danoso das nossas decisões erradas. Que a Justiça nos seja pródiga, pelo menos por uma vez! E que possamos nos ecos de Virgilio e escrever na bandeira de Mariana: Jus quae será tamen!
*Professor e Advogado
Meu comentário: os fatos relatados pelo Dr. Israel Quirino neste artigo são verídicos e que foram objetos, na época, de artigos e comentários meus nos meus antigos jornais “Folha de Mariana”, “Jornal de Mariana” e neste blog, sob a forma de “Memória Política” É um depoimento sincero de um marianense indignado como eu, sobretudo insuspeito, já que ele foi filiado a uma tradicional facção política do município, autora contumaz, intelectual e de fato desses citados malefícios causados à cidade de Mariana e que a Justiça, com bem frisou Quirino, jamais coibiu e condenou.
Que, de agora em diante, a Justiça, ainda que tardia, não seja tão generosa com aqueles que tanto a sabotam e a descaracterizam!
Que, de agora em diante, a Justiça, ainda que tardia, não seja tão generosa com aqueles que tanto a sabotam e a descaracterizam!
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