quinta-feira, 7 de agosto de 2008

Causos políticos


Minas perde um dos mais marcantes líderes da ex-UDN, que exerceu cargos de influência nos governos Milton Campos, Magalhães Pinto e Rondon Pacheco. Foi sepultado ontem no Cemitério Parque da Colina o advogado, professor e ex-deputado José Cabral. Natural de São Sebastião da Bela Vista (antigo distrito de Santa Rita do Sapucaí), no Sul do Estado, nasceu em 21/8/1911, portanto iria fazer este mês 97 anos. Exerceu dois mandatos na Assembléia Legislativa, entre 1951 e 1959.
Recentemente, aos 93 anos, José Cabral lançou um livro “Minha Vida e a de outros “Irmãos da Opa”. Neste livro ele conta a amizade que tinha com o seu colega advogado e deputado estadual Dr. Celso Arinos Mota, líder da Esquerda em Mariana durante 40 anos. Seu primeiro emprego como advogado foi ocupar o lugar de Dr. Celso no Escritório de Advocacia do Dr. Nilo Liberato Barroso, em Belo Horizonte. No seu livro, na página 50, ele conta como conheceu Celso Mota. “...No dia seguinte apresentei-me ao saudoso Dr. Nilo. Explicou-me ele que trabalhava no escritório um bacharelando de Direito, que deixaria o emprego no fim do ano. Era o saudoso Celso Arinos Mota, mais tarde chefe político em Mariana (onde recebeu o apelido de Dr. Maromba) e deputado estadual quando eu também o era, nos governos dos saudosos Juscelino Kubitscheck e Bias Fortes, ele era governo e eu oposição (UDN).

Na página 75, José Cabral conta o seguinte episódio. “...O advogado Celso Arinos Mota, de quem já falei, pois lhe cobrira a vaga no escritório do Dr. Nilo, pediu-me que fosse a Mariana defender um homicida que era seu correligionário, mas se o defendesse, a família da vítima não mais votaria no Partido que ele chefiava com mão de ferro no município. Li algumas peças do processo e parti para Mariana, hospedando-me na casa daquele colega, cuja esposa viera visitar parentes na Capital. Pouco antes de se iniciar a sessão do júri, disse-lhe que precisava conhecer o homicida que iria defender, para que ele pudesse confiar em mim (confiança à primeira vista). O Celso disse-me: “Ora bolas, é aquele que lhe serviu o café da manhã, lá em casa”; ao que lhe redargüi: você, Dr. Maromba, é de morte, não perdoa nem os detentos, explorando-lhes o trabalho. “Nada disso, eles se sentem prestigiados, trabalhando para mim”.
Iniciados os debates, na sala do júri, comecei a pôr as manguinhas de fora, provocando o Promotor de Justiça. Em dado momento, porque fizera a platéia rir, o Promotor, que por sinal era surdo, “vendo” as gargalhadas, advertiu-me. “V. Exª está querendo transformar este recinto em picadeiro de circo”, ao que lhe retruquei: pois se assim o for, eu serei domador de feras e V Exª a mulher que engole a espada! O Dr. Juiz de Direito, protegendo-se atrás de um grosso livro, caiu em gargalhada, fazendo coro com a platéia, que nessa altura “estava comigo”, gozando o Promotor. De qualquer forma, o homicida “saiu livre”, mas devendo muito pouco a mim, já que seu “trunfo” foi mesmo o Maromba, ao sabor de quem se escolheu o corpo de jurados...”


Meu comentário: Esse episódio acima aconteceu na década de 60. O Promotor de Justiça e o Juiz de Direito eram meus conhecidos. Conheci também o réu que realmente prestava serviços na casa de Dr. Celso. Naquele tempo, portanto, antes da Constituição de 88, quem indicava juízes e promotores para as comarcas eram os prefeitos, deputados estaduais e governadores . Os jurados eram escolhidos pelo chefe político do município em conluio com escrivão do crime também nomeado pelos políticos locais. Quando havia um julgamento na cidade, certo prefeito, ao saber quais os jurados que foram escolhidos pelos advogados das partes, já antecipava e acertava numericamente se o resultado do julgamento seria a favor ou contra o réu.

Certa vez, em Santa Maria do Suaçuí (MG), onde eu trabalhava no Banco do Brasil, em 1970, fui procurado pelo então Juiz de Direito daquela comarca. Ele me dissera que a comarca de Mariana estava vaga e queria vir trabalhar aqui. Ele me perguntou se eu era amigo do prefeito de Mariana, pois precisava da indicação dele para vir para cá. Eu disse que era amigo do então prefeito, mas o aconselhei a não pedir a sua intercessão, porque ele não era da Arena que estava no poder estadual, mas do MDB que estava na oposição. Ponderei que, ao invés de ajudar, iria atrapalhar a sua pretensão.
Como sempre acontecia, o Juiz nomeado para Mariana foi indicado pelo líder político da Arena que posteriormente se tornou prefeito de Mariana. O nome do juiz que, por sinal, foi muito subserviente ao então prefeito, não direi o nome, pois ainda está vivo e aposentado,em BH.

Era assim que eu via funcionar a justiça em Mariana no período de 1950 até a promulgação da Constituição Estadual em 1989, quando os magistrados se tornaram independentes, pois passaram a ser nomeados pelo próprio Poder Judiciário, sem as malditas interferências políticas.

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