domingo, 8 de março de 2009

Memória cultural

Curso de Direito
Ao rever meus arquivos, deparei-me com um documento histórico: o convite para a aula magna inaugural do Curso de Direito da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP) em Mariana, assinado pelo Reitor Renato Godinho Navarro, o Prefeito João Ramos Filho e o Diretor do ICHS Luiz Tyller Pirola, realizada em 16.11.1994, no Ginásio Dom Frei Manoel da Cruz.
Este importante evento cultural realizado 15 anos atrás, inspirou-me a escrever uma Memória Cultural especial abordando os bastidores da bela, porém malograda tentativa de instalação do Curso de Direito em Mariana. A opinião pública de Mariana ficará sabendo os nomes das pessoas que lutaram a favor da instalação dele no município e daqueles que foram contra e levaram o curso de Direito para Ouro Preto. Ficará sabendo que a maioria dos professores do ICHS foi contra a instalação do Curso de Direito em Mariana só por corporativismo, egoísmo, vaidade e medo de serem ofuscados por um curso que tem muito mais prestigio no meio acadêmico e universitário. Muitos ainda lecionam no ICHS. Alguns, aposentados, ainda residem em Mariana e perambulam pela cidade metidos a pesquisadores e historiadores e, caras-de-pau, ainda posam de defensores intransigentes do patrimônio histórico e cultural da cidade. Me engana que eu gosto!
O professor Luiz Tyller Pirola, autor da inspirada idéia de instalar o Curso de Direito em Mariana e, por isso, já mereceria o título de Cidadão Honorário da cidade, em entrevista exclusiva, me contou as terríveis dificuldades de bastidores que teve para realizar o seu projeto. Na época, ele contava apenas com o apoio dos professores Lázaro da Silva, já falecido, Hebe Rola, Sebastião Maia, José Benedito Donadon Leal e Celso Taveira. A maioria do corpo docente foi contra. Ele teve, também, muito apoio do saudoso arcebispo Dom Luciano e do então prefeito de Mariana João Ramos Filho.
A opinião pública marianense precisa saber também que a Universidade Federal de Ouro Preto, quando o reitor ainda era Dirceu do Nascimento, deu dois golpes sujos contra Mariana: um contra a Arquidiocese de Mariana e outro contra o município de Mariana. A Arquidiocese cedeu em comodato para o ICHS por mais de meio século imensa área do antigo Seminário Menor. Em contrapartida a UFOP teria, entre outras obrigações, restaurar o antigo Palácio dos Bispos. Além de não restaurar, deixou o prédio cair em ruínas. Quem restaurou foi a Petrobras. Por causa disso e descumprimento de outras cláusulas, o comodato entre a UFOP e a Arquidiocese de Mariana está sendo questionado na Justiça.
A prefeitura de Mariana, ao tempo do prefeito Cássio Brigolini Neme, construiu um prédio para sediar o Curso de Direito. Irresponsável e cinicamente o Dirceu do Nascimento declarou, na época, pela imprensa, que o prédio não tinha segurança para sediar o curso de Direito e que iria utilizá-lo para outro curso. Ora bolas, se não há segurança para um curso como haverá para outro? Foi um insulto à inteligência dos marianenses. A Câmara Municipal de Mariana, em 02.02.98, divulgou uma Moção de Repúdio ao reitor Dirceu de Nascimento declarando-o persona non grata ao município de Mariana.

Moção de repúdio
“Nós, vereadores à Câmara Municipal de Mariana, vimos, por meio deste instrumento, propor Moção de Repúdio ao Magnífico Reitor da Universidade Federal de Ouro Preto, Professor Dirceu do Nascimento pela abjeta atitude de não ter comparecido à cerimônia de entrega do prédio do Curso de Direito, realizada no dia 31 de dezembro de 1997. Esta cerimônia, marcada para as 10 horas, na verdade só teve início às 11,20, pois todas as autoridades presentes e uma multidão de marianenses aguardaram ansiosos a chegada do professor Dirceu ou um representante da Reitoria. Desonrando o convite que lhe foi feito e apropriando-se de uma conduta incompatível com o cargo, o Reitor não compareceu à cerimônia, nem enviou qualquer representante da reitoria para representá-lo. Mais ainda, não teve sequer a gentileza de justificar sua ausência frente a comunidade de Mariana.
É bom acrescentar que não é segredo a volúpia deste senhor em usar de todas as maneiras que lhe estiverem ao alcance para impedir o retorno do Curso de Direito para o Município de Mariana. Suas declarações sempre demonstraram sua posição.
Consideramos a atitude acima exposta, desrespeitosa não apenas ao Poder público do Município de Mariana, mas a cada marianense em particular. Repudiamos a deselegância que beira a puerilidade com que o Reitor tem se inflamado contra o retorno do Curso de Direito às nossas terras e finalmente, o consideramos persona non grata ao nosso município.
Sala das sessões, 02 de fevereiro de 1998.
José Geraldo Perdigão, Presidente; Raimundo E. Horta, Vice-presidente; Luciano Guimarães, Secretário; Antonio Fernandes da Costa; Benedito Gomes de Morais; Corjesu Quirino Filho; Cléliton da Conceição de Souza; Fernando S. Gomes; Francisco de Oliveira Miranda; Jamil José Abjaudi; Jehová V. Magalhães; José Jarbas Ramos; Luciano José Rolla Santos; Marcelo Monteiro Macedo e Sebastião Evangelista Fernandes.


Na época, escrevi no jornal “Estado de Minas”, de 29.09.2001, um artigo condenando a molecagem do reitor Dirceu do Nascimento contra Mariana, cuja íntegra transcrevo abaixo.
A Faculdade é de Mariana
“Ao instalar a Faculdade de Direito em Mariana, num gesto talvez de gratidão com a Arquidiocese que lhe concedeu em comodato, por 51 anos, as amplas e confortáveis dependências do antigo Seminário Menor para instalação do Instituto de Ciências Humanas e Sociais (ICHS), o ex-reitor da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP), professor Renato Godinho Navarro, quis ampliar e democratizar para fora dos limites territoriais daquela tradicional instituição educacional a universalização do ensino superior na região dos Inconfidentes onde, até então, tinha acesso apenas uma privilegiada elite universitária.
A bem da verdade, a instalação da Faculdade de Direito em Mariana nunca foi pacífica. Logo de início, encontrou forte resistência interna e corporativa dos professores do ICHS contra a cessão de espaço físico no mesmo prédio para funcionamento do Curso de Direito. Para dirimir essa pendência, o Município, para sediar provisoriamente o curso, colocou à sua disposição alguns prédios públicos, todos recusados.
Considerando em sua visão que no município não havia espaço físico adequado para a instalação da Faculdade de Direito, o atual reitor da UFOP, Dirceu do Nascimento, deu um ultimato ao então prefeito Cássio Brigolini Neme: se o prédio não ficasse pronto até 31 de dezembro de 1997, a Faculdade seria transferida para Ouro Preto. Para surpresa geral, inclusive do próprio reitor, o prédio ficou pronto na data estabelecida pela reitoria.
A parir daí, começaram as contradições do reitor. Primeiro alegou que o prédio não tinha segurança, embora a estrutura do prédio tivesse sido construída por arquitetos e engenheiros da própria UFOP. Depois, em entrevista a diversos jornais, o reitor declara que vai implantar no mesmo prédio condenado por ele outros cursos. Ora bolas, se o prédio não tem segurança para o Curso de Direito, por que serve para outros cursos?
A Juíza Federal Maria Helena Carrara Alvim Ribeiro deferiu liminar a favor do município de Mariana, obrigando o reitor a instalar o curso no prédio construído, cujo laudo pericial, também favorável, constatou que, após pequenos reparos, se encontraria apto a sediar atividades acadêmicas, dentro das suas limitações físicas. Até recentemente, o prédio, sem nenhuma proteção e vigilância da UFOP, estava criminosamente abandonado no meio do mato, sofrendo impunemente depredações de portas, janelas, esquadrias e vidros completamente quebrados. Uma vergonha! As obras de recuperação do prédio começaram depois que a Folha Marianense, de 15.09.2001, denunciou o seu abandono. Estão restaurando, a toque de caixa, o prédio, não com a finalidade original de sediar o Curso de Direito, mas sim, o Curso de Magistério Superior especifico para formação de professores de ensino público municipal, mesmo estando a destinação do imóvel ainda “sub judice”, o que impede qualquer nova intervenção ou desvio de finalidade, enquanto a causa ainda não transitou em julgado.
Portanto, creio que, em função de tudo que a Arquidiocese e o Município de Mariana já fizeram para a instalação do ICHS e da Faculdade de Direito, o atual reitor, num gesto de nobreza, deveria, também por uma questão de gratidão, reconsiderar a sua decisão sediando o Curso de Direito em Mariana no prédio generosamente doado pelo contribuinte marianense.”
Abaixo o histórico e importante depoimento do Prof. Luiz Tyller Pirola sobre os fatos que impediram a instalação do Curso de Direito em Mariana.
“Em 1992, regressando de meu curso de doutorado na USP, procurei Dom Luciano, a quem não conhecia pessoalmente. Era a cerimônia religiosa, na Sé, dos restos mortais dos jovens que morreram na ditadura militar. Aproximei-me dele, na saída, lateral do órgão da Sé e disse-lhe que precisava falar-lhe. Ele, apressado disse-me: Agora estou indo ao cemitério, não posso (algo assim, a memória é um pouco falha). Disse-lhe em poucas palavras que queria fundar uma comissão de direitos humanos em Mariana. Ele estacou, imediatamente, transfigurou-se, perguntou quem eu era e marcou para o mesmo dia uma conversa inicial em sua residência, no Palácio Arquiepiscopal.
E assim fundamos a Comissão, com a participação de algumas alunas do curso de Letras da UFOP. Com o tempo, vimos que era necessário um advogado em tempo integral, pois quando havia necessidade, Dom Luciano pedia a, por exemplo, Dr. Derly e Dr. Marcílio Queiroz, dos que eu me lembro, seus serviços gratuitos. Bem, a comissão acabou desvirtuando-se um pouco, pois serviu mais para arrumar emprego e orientar esta e aquela família com problemas conjugais e com filhos com drogas.
Em 1994, assumi a Direção do ICHS e imediatamente comecei a planejar o que poderia ser feito. Em uma de minhas inúmeras conversas com Dom Luciano, ele estava feliz por eu ter assumido cargo tão honroso, disse-lhe de minha intenção de trabalhar pela fundação de um curso de Direito em Mariana e no ICHS. Entusiasmadíssimo, Dom Luciano fez-me ver que tudo faria para ajudar. Fui amadurecendo- rapidamente a idéia e primeiramente procurei o então prefeito João Ramos Filho, pois eu precisava apresentar algo de concreto à Universidade, em termos de uma possível parceria. O que, de imediato me ocorria, era a necessidade de assistência jurídica gratuita aos necessitados. Isso poderia vir com o trabalho dos estagiários do próprio curso.
Na primeira conversa com o Prefeito, a quem não conhecia ainda pessoalmente, expus-lhe minha intenção de uma parceria e, para minha surpresa, ele me disse: olha, professor, escreve em um papel tudo que o curso vai necessitar que nós vamos fazer. Saí da Prefeitura um tanto incrédulo. Coloquei no papel os seguintes itens: 1- Material para drenagem da mina de água que fica na entrada do ICHS, à esquerda do estacionamento e de quem sobe o morro para acessar a rodovia, ficando a mão de obra por conta da Universidade; 2 - pavimentação do estacionamento e calçamento do restante da estrada de acesso ao ICHS com material e serviço por conta da Prefeitura; 3 - Restauração do Palácio dos Bispos, com material da Prefeitura e mão de obra da Universidade, para abrigar o Centro de Assistência Jurídica Gratuita do Curso de Direito; 4 - Cessão de um prédio para o curso, inicialmente e depois uma cessão definitiva; 5- Compra da Biblioteca; 6 - Secretária para atender o curso (a secretária da prefeitura foi Lourdes, que atualmente trabalha na Policlínica; 7 - Equipamentos como telefone e xérox; 8 - Construção de pequenos apartamentos para os professores do ICHS, de Letras e História e não somente de Direito, uma vez que a maioria era de fora de Mariana.
Tratei, então, de procurar a administração superior da Universidade para verificar se havia possibilidade técnica. O Reitor, Prof. Renato Godinho, recebeu com muita simpatia a idéia. No entanto. queria que eu visse com o prefeito a possibilidade de a Prefeitura de Mariana arcar com os salários dos professores. Fui contra desde o início, pois isso criaria duas categorias de professores, além de possíveis ingerências políticas. Mesmo assim falei com o Prefeito e marcamos reunião com ele, aqui em Mariana. Depois de muito debate, com o reitor insistindo com seu ponto de vista e eu com o meu. Mesmo que o prefeito concordasse, e ele, em última instância iria assumir - como me disse- nada garantiria que o próximo prefeito daria continuidade ao pagamento dos salários.
Bem, depois de ter o aval da Reitoria, levei a idéia ao ICHS. Foi quando as dificuldades, realmente, aconteceram. Ocorre que fui eleito com apenas sete votos de docentes, mas com a esmagadora maioria dos alunos e funcionários. Iniciou-se um movimento, liderado pela professora Solange, ex-Diretora do ICHS, protestando contra a criação do Curso de Direito no ICHS. Entendiam os contrários, que o curso prejudicaria Letras e História, pois haveria uma dispersão de recursos. Tal fato não se sustentava, pois as rubricas eram diferentes, cursos novos requerem recursos advindos de outras rubricas que não aquelas destinadas aos cursos já instalados, pelo menos era o que estava vigente àquela época. No entanto, apesar de minhas longas e cansativas argumentações, em inúmeras assembléias gerais, a maioria dos professores permanecia irredutível, todos temerosos de que os cursos instalados: Letras e História fossem prejudicados. Finalmente, os resultados das últimas assembléias gerais, refletiram o resultado de minha eleição, pois os funcionários e alunos votaram a favor da instalação do Curso de Direito.
Os professores que estavam de acordo foram: Hebe Rolla, Lázaro da Silva, Sebastião Maia, José Benedito Donadon-Leal e Celso Taveira, além de mim próprio.
Eu sabia que também a comunidade marianense estava de acordo, pois, nas Assembléias Gerais, timidamente eu via um ou outro cidadão, além do que, eu era constantemente parado nas ruas pelas pessoas querendo saber do Curso, do vestibular, como seria, enfim, contentes pelo crescimento institucional e evidente benefício à comunidade.
Mesmo depois do resultado das Assembléias Gerais, veio a público um abaixo assinado dos professores descontentes com o fato.
Quando todos os documentos estavam, enfim, prontos, quando, a muito custo, consegui encaminhar a criação do curso, a despeito da enorme resistência interna do ICHS, a Reitoria mandou ao MEC a documentação para a autorização do início do curso.
Certo dia, estava em meu Gabinete, quando recebi um telefonema da CNBB, de Brasília. Era Dom Luciano. Como Dom Luciano estava acompanhando, de perto, a criação do curso, telefonaram-lhe do MEC, dizendo que faltava no documento uma espécie de apresentação e justificativa na documentação enviada da Reitoria.
Certamente por um desencontro, plenamente justificado, dadas as condições difíceis enfrentadas até então. Como havia muita pressa para que o curso iniciasse ainda no final do ano, Dom Luciano ofereceu-se para fazer o documento faltante. Obviamente aceitei, e ele o fez de próprio punho, documento este que se encontra nos arquivos do MEC, com certeza. Logo chegou o dia de irmos a Brasília para encontro com o ministro da Educação. Como sempre, Dom Luciano foi quem conseguiu marcar a reunião, apesar da agenda pesadíssima do Ministro. Fomos a Brasília, eu, o Reitor Renato Godinho Navarro, o prefeito João Ramos Filho, o secretário de Obras do município Newton Godoy e o deputado Ibrahim Abi- Ackel. Dom Luciano já lá estava nos esperando. Assim o Ministro nos recebeu. Primeiro falou o reitor Renato dizendo da importância da criação do novo curso. Em seguida, falei explicando que faria parte dos planos a restauração do antigo palácio dos Bispos. Entreguei, então, ao ministro as fotos que levei do palácio já bem deteriorado, como todos se lembram. O Ministro, que já estava inclinado a aprovar o projeto, encantou-se definitivamente, pois, além da restauração, com mão de obra da Universidade e material cedido pela Prefeitura de Mariana, o prédio serviria para abrigar a Biblioteca e também a Assistência Jurídica Gratuita que seria exercida pelos estudantes como parte de suas atividades de estágio.
O Ministro perguntou ao prefeito se ele honraria a sua palavra e o prefeito respondeu que não haveria o menor problema, pois o município não conseguia gastar toda a verba destinada à educação.
O Ministro concluindo a audiência disse: li com muita atenção o projeto, o departamento competente do ministério também, ouvi a todos atentamente e o projeto está aprovado, dou por encerrada a reunião. Agradeceu a presença de todos, desejou-nos muito sucesso e nos deu os parabéns, não sem antes de cumprimentar a todos e em particular a Dom Luciano com muitíssimo respeito que tinha por ele.
(Nota de esclarecimento: um fato inusitado não revelado pelo Prof. Tyller aconteceu durante essa audiência com o Ministro em Brasilia. Para surpresa geral do Ministro da Educação, do Reitor da UFOP, de Dom Luciano e João Ramos, o então deputado federal Ibrahim Abi-Ackel foi frontalmente contrário à instalação do Curso de Direito em Mariana, o que causou desagradável constrangimento de todos os presentes, provocando irritação do Ministro que condenou a intempestiva atitude e estranha conduta do deputado).
Bem, do início das tratativas até o começo das aulas, foram exatamente nove meses.
Quero lembrar que, quando começaram as enormes dificuldades para um espaço físico para o curso (inicialmente no prédio do INSS, em frente à delegacia de Polícia, depois no Dom Frei, e depois no ICHS), Dom Luciano me chamou e disse-me que ofereceria as salas de aula do Seminário São José, caso fosse preciso e faria a cessão por escrito, para maior segurança do curso. Infelizmente, Dom Luciano era mal visto pela maioria dos professores do ICHS, assim, somente levei a proposta ao próprio curso de Direito. Mas como os ânimos estavam muito acirrados, os alunos e professores decidiram que o curso era do ICHS e, portanto deveriam ir para o ICHS, pois em uma projeção, à época, haveria espaço suficiente até a conclusão do prédio próprio. Para enfrentar a situação, os professores do curso usaram de argumentos jurídicos irretocáveis, e assim foram para as salas de aula do ICHS. Bem, depois eu perdia reeleição e todos sabem o que aconteceu.
Entendi, perfeitamente, que a par dos temores pelo bem estar dos cursos instalados, o que estava em curso era uma oposição política que se iniciou com minha eleição e conseqüente derrota do candidato apoiado pela Professora Solange. O que deve ser notado é que o candidato derrotado, professor Villalta, inicialmente contrário e fazendo cerrada oposição à minha gestão, entendeu a importância da instalação do novo curso, comparecendo, em um gesto de grandeza, inclusive à aula inaugural, no salão nobre do Colégio Padre Avelar, o que muito me comoveu. Outros, como Crisóston Terto Vilas-Boas, embora não tenham participado da criação do curso, sempre entenderam a importância da pluralidade da convivência cultural, e viram com muita simpatia a vinda do curso, ao largo das idiossincrasias que cercavam o grupo ligado à professora Solange. Um pouco mais tarde, outros professores foram percebendo o processo político e assumiram a nobre posição intelectual que todo humanista tem, como por exemplo, o professor Angelo Carrara, que hoje empresta seu brilho à Universidade Federal de Juiz de Fora.
Bem, na Reitoria também havia oposição, pois uma parte da administração superior entendia que poderia não existir viabilidade financeira e técnica à instalação de um novo curso. À época era chefe de Gabinete da Reitoria o Prof. Celso Taveira e como Vice-Reitor, o Prof. Dirceu do Nascimento e procurador Geral, Dr. Sérgio Lélis, simpatizantes de primeira hora e incentivadores das horas mais difíceis.
Houve, em determinado momento, um impasse nas negociações, pois na Prefeitura havia muito receio por parte do então Secretário de Obras, Newton Godoy, em vista dos termos do convênio que, como todo convênio com órgãos federais, prevê multas pesadas a qualquer não cumprimento de mínimos itens. Todavia, o Prefeito João Ramos estava firmemente decidido a firmar a parceria e nada o demoveu. No entanto, começou a dar mostras de impaciência ao notar a demora nas negociações com a Reitoria e com o ICHS. A determinada altura, em um dos inúmeros encontros que tivemos em seu gabinete, disse-me que se não saísse o curso do papel, logo, ele também estaria fora.
Levei o fato ao reitor que resolveu, imediatamente, convocar uma reunião com os que apoiavam e os que estavam contra a implantação do curso na administração superior. Naquela histórica reunião, o Reitor, Prof. Renato, listou os pontos negativos, ouvindo os manifestantes contrários e, em seguida, em uma folha de papel, passou a listar os benefícios da instalação do Curso. Foi insofismável a todos o resultado, os benefícios superavam amplamente os pontos contrários. Assim, com o definitivo aval da Reitoria e da Assembléia Geral do ICHS, levei a notícia ao Sr. Prefeito que ficou exultante.
Tratamos então de organizar o curso. Precisávamos montar as ementas para enviar ao Ministério da Educação. Entrei em contato com o professor Pedro Paulo, por indicação de Dom Luciano, e o prof. Pedro Paulo me colocou em contato com ninguém menos que o brilhante professor Baracho, da UFMG. Ambos dispuseram-se a vir até Mariana. A Universidade mandou um carro buscá-los e em meu gabinete, a Sala da Estrela, dos tempos do Seminário Menor, eles trabalharam com afinco e elaboraram todas as ementas necessárias, base dos futuros programas das disciplinas.
Nesse meio tempo, o prefeito colocou a maior parte do Colégio Padre Avelar à disposição do novo Curso, já iniciando estudos para uma cessão definitiva. Mas, para iniciar, as aulas ocorreram, por um tempo, onde funcionava o antigo INPS, em frente à Delegacia de Polícia.
Eventos importantes ocorreram, dentre eles, eu trouxe Orlando Villas Boas para fazer uma palestra no ICHS e outra no auditório de Colégio Padre Avelar para os alunos de Direito. E, algum tempo depois, por iniciativa minha, do professor Benedito Donadon Leal e do Professor Ângelo Carrara, propusemos a concessão do Título de DOUTOR HONORIS CAUSA a Orlando e seu irmão Cláudio Villas-Boas, cuja solenidade foi na Casa da Ópera de Ouro Preto.
Assim, com muitas dificuldades, fui encaminhando as tratativas, indo quase que diariamente ao gabinete do Prefeito para agilizar as coisas.
Para o funcionamento do curso, havia a necessidade de uma biblioteca. João Ramos imediatamente determinou a abertura de um edital e comprou os livros necessários, no valor de cinqüenta mil dólares, àquela época o dólar estava, eu acho, em torno de 1,10 ou 1,20 reais. De qualquer modo, uma quantia muito superior a que a Universidade destinava a todas as bibliotecas de suas unidades.
Como diretor eu era o presidente do Conselho Departamental, que reunia os departamentos de Letras, História e Educação. Ali tive inúmeras e tantas dificuldades por parte dos opositores do curso, a duras penas os dois representantes do curso de direito que tinham assento, e eu, enfrentávamos as batalhas em que se transformavam cada reunião.
Passados dois anos e dois meses de minha gestão, tendo como vice, inicialmente o professor Aldo Eustáquio Assir Sobral, e depois a professora Hebe, concorri à segunda parte do mandato, tendo como vice o professor Benedito. Isso porque o ICHS tinha uma norma de dividir o mandato legal do diretor em dois anos, com direito a concorrer a mais dois anos, assim, o perdedor assinava uma carta de renúncia para poder ter estatuto legal a posse do novo diretor. Foi o que aconteceu, pois perdi a reeleição ao final de dois anos. (E DOIS MESES MAIS POR CONTA DE UMA GREVE GERAL na Universidade) Assumiu então a Direção do ICHS, a professora Heliana Maria Brina Brandão, frontalmente contrária ao curso de Direito. Quando as pressões já estavam insuportáveis, a ponto de o curso ser inviabilizado, por conta da total oposição da professora Brina e (entenda-se, grupo da professora Solange) houve uma reunião no Conselho Departamental, da qual não participei, pois não era membro, mas relatada a mim pelo então reitor professor Dirceu do Nascimento, a professora Brina e apoiadores fizeram ver ao professor Dirceu a inconveniência do funcionamento do Curso de Direito, ligado ao ICHS, pois atrapalharia os planos institucionais, segundo eles, dos cursos de Letras e História. O professor Dirceu, um homem sempre muito direto em suas propostas, perguntou: Bem vocês não querem o curso aqui? Com a imediata resposta negativa, Dirceu disse: a partir de agora o Curso de Direito vai para Ouro Preto e ficará ligado diretamente à Reitoria. E foi o que aconteceu”, concluiu o Professor Luiz Tyller Pirola.

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